quarta-feira, janeiro 11, 2006

Exigência de PPB (Projeto Produtivo Básico) nas Licitações de Equipamentos de Informática

Jaqueline Nunes Santos
Advogada, Consultora de Direito Administrativo



No tocante à exigência do chamado Projeto Produtivo Básico - PPB nos procedimentos licitatórios para a aquisição e contratação de Equipamentos de Informática, anoto que em consonância com as disposições emanadas do art. 3º, § 3º do Decreto nº 3.555/2000, alterado pelo Decreto nº 3.693/2000, deveriam ser fabricados no País, com significativo valor agregado local, em conformidade com o comando do art. 3º, II, da Lei nº 8.248/1991.


Tal exigência, contudo, restou modificada com o advento da Lei nº 10.176/2001, que, introduzindo alteração no art. 3º da Lei nº 8.248/1991, transmudou o pressuposto de serem “II – bens e serviços produzidos no País, com significativo valor agregado local” para “II – bens e serviços produzidos de acordo com processo produtivo básico, na forma a ser definida pelo Poder Executivo.” (grifo nosso).


Mister frisar que a matéria ficou pendente do que viesse a ser futuramente definido pelo Poder Executivo como Processo Produtivo Básico - PPB. Restou assim, inteiramente superada a forma de preferência prevista no Decreto nº 3.555/2000, com a alteração introduzida pelo Decreto nº 3.693/2000, face a modificação de elemento substancial para a atribuição da preferência então determinada.


Tal preferência, todavia, nos moldes da legislação vigente e salvo melhor juízo, só poderia ser atribuída com supedâneo ao disposto no inciso II do § 2º do art. 3º da Lei nº 8.666/1993, ou seja, como critério de desempate, o que não se nos afigura cabível no caso do pregão, porquanto inviável a ocorrência da hipótese nesse caso, já que decidida tal modalidade de licitação por meio do menor lance. Teria que haver, portanto, no caso de pregão, para a atribuição do direito de preferência, a agregação de outros elementos ainda não dispostos na legislação reguladora da matéria.


Cumpre por oportuno, de molde a possibilitar cristalino entendimento da questão, invocar a Lei nº 11.077/2004, cujo art. 1º acresceu o § 3º ao art. 3º da Lei nº 8.248/1991 e reza in verbis:



“§ 3º A aquisição de bens e serviços de informática e automação, considerados como bens e serviços comuns nos termos do parágrafo único do art. 1o da Lei no 10.520, de 17 de julho de 2002, poderá ser realizada na modalidade pregão, restrita às empresas que cumpram o Processo Produtivo Básico nos termos desta Lei e da Lei no 8.387, de 30 de dezembro de 1991”.




Não obstante refira o dispositivo supra destacado, que a aquisição de bens e serviços de informática considerados comuns “poderá ser realizada na modalidade pregão, restrita às empresas que cumpram o Processo Produtivo Básico nos termos desta Lei e da Lei no 8.387, de 30 de dezembro de 1991”, parece-nos que o objetivo da Lei não foi o de restringir a participação na licitação, apenas a quem atenda ao Processo Produtivo Básico, mas em verdade, empregar tal atributo para fins de conferir determinada vantagem, no curso do procedimento de licitação, àquele que o cumpra. Mencionada vantagem é precisamente o denominado “direito de preferência” tratado no caput do dispositivo.


Reconhecendo ser a matéria sub examine deveras polêmica, ratificamos que a mesma encontra-se ainda pendente de devida regulamentação, a qual se espera, deverá pacificar definitivamente os aspectos jurídicos inerentes à questão, bem como definir como se atribuirá o direito de preferência e, por conseguinte, como se dará a prova documental do atendimento ao PPB.


O texto legal é de cabal infelicidade, ao afirmar que a modalidade licitatória fica “restrita às empresas que cumpram o Processo Produtivo Básico”. O atendimento ao denominado PPB, constitui requisito, meramente para efeito de atribuição do chamado “direito de preferência” e não para pré-exclusão de possíveis participantes do certame, circunstância que ensejaria verdadeira reserva de mercado e limitação do universo de participantes, o que não constitui em absoluto o objetivo da Política de Informática.


Assim, faltante a regulamentação, não vemos como se possa aplicar o direito de preferência ou mesmo reconhecer, na espécie, o perfazimento do atributo imprescindível à obrigatória incidência do PPB, pois não há norma que diga como se deva atendê-lo, para fins de licitação, nem qual documentação será hábil a demonstrar o seu cumprimento.


Buscando elidir mais esse foco de controvérsias, haja vista que a comprovação exigida em muitos dos certames editalícios vem sendo realizada mediante a apresentação pela licitante da “Portaria do Ministério da Ciência e Tecnologia” emitida em, seu nome, nos socorremos no posicionamento emanado da consultoria Jurídica do próprio MCT, onde obtivemos pronta acolhida por parte daquele órgão jurídico, da Advocacia Geral da União, que manifestou-se de forma categórica nos seguintes termos:



“Apesar disso, sabe-se que há órgãos e entidades elegendo, via edital, documentações para esse fim, mas sem atentar que isso é temerário, pois semelhante tarefa constitui atribuição privativa do Presidente da República, já que somente a ele compete regulamentar as leis (CF, art. 84, IV).

Exemplos dessa situação são os casos em que o licitador, fazendo uma analogia com a habilitação concedida para a fruição dos incentivos fiscais -- para os quais igualmente é exigido o atendimento a PPB -- atribui à portaria interministerial MCT/MDIC/MF, que concede tal habilitação, efeito de prova para fins de licitação.


Portanto, qualquer documento que se apresente para essa finalidade, a nosso ver é inválido.


Impõe-se, pois, aguardar a regulamentação”.


Isto posto, firmamos entendimento, no sentido de que o pregão possa ser regularmente empregado, para a aquisição de bens de informática considerados comuns, visto tratar-se, no caso, apenas de mais uma modalidade de licitação, devendo, entretanto, ser o procedimento realizado sem a atribuição do chamado direito de preferência, decorrente de atendimento a PPB, justificando-se tal circunstância nos autos.

Per fine, sendo essa a opção do gestor público responsável, todos que atendam às demais condições exigidas na peça editalícia podem participar, em igualdade de condições, decidindo-se o certame exclusivamente pelo critério do menor preço.

Em virtude das linhas supra expendidas, registramos que compete exclusivamente à Administração analisar suas reais necessidades e optar pelo procedimento que julgar mais adequado para atendê-las em sua plenitude, tudo dentro do princípio da mais ampla discricionariedade e sob critérios de oportunidade e conveniência, observada primordialmente o amparo e a legalidade da conduta administrativa adotada.