terça-feira, junho 10, 2008

O SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS

Por Jaqueline Nunes Santos[i]


INTRODUÇÃO
Atuando na área de Licitações e Contratos há algum tempo, é fácil perceber que todos sabem que para contratar obras, serviços, adquirir e alienar bens, a Administração Pública é obrigada, em regra, a licitar.

Todavia, não sabem o porquê dessa exigência.

A licitação, exigida no inciso XXI do art. 37, da Constituição da República Federativa do Brasil, cumpre o papel fundamental do Estado, ou seja, garantir a igualdade de tratamento a todos os administrados que tenham interesse em manter relações comerciais com a Administração Pública, mesmo que a garantia desse princípio possa significar o sacrifício de outros interesses aparentemente mais vantajosos.

Para assegurar o direito constitucional acima citado, foi editada a Lei n.° 8666/93 (tendo sofrido ao longo dos anos algumas alterações).

A licitação tem como fundamento precípuo a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública. Contudo, deve-se ter em mente que a expressão “proposta mais vantajosa”, deve necessariamente ser atrelada aos princípios que norteiam o Direito Administrativo.

A proposta a ser considerada deve ser obedecer aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da eficiência e da publicidade. Registre-se que tais princípios são indisponíveis face ao disposto no art. 37 “caput” da Lei n.° 8666/93 combinado ao art. 3° da Lei de Licitações e Contratos Administrativos.

Assim, podemos dizer que a proposta mais vantajosa para a Administração e, portanto, para os administrados, é a que observando os princípios norteadores do Poder Público, apresente, de acordo com os tipos de licitação permitidos, as melhores condições técnicas e econômicas.

Seguindo essa linha de raciocínio, podemos afirmar que o princípio da eficiência, na licitação, requer do administrador que este utilize técnicas que permitam satisfazer às necessidades do cidadão, com a melhor qualidade a um custo justo, ou seja, administrando cientificamente os recursos oriundos dos cofres públicos.

Somado a esse pensamento, devemos citar a Lei Complementar 101/00, conhecida como “Lei de Responsabilidade Fiscal”, que tem como regra principal o comprometimento das despesas públicas à efetiva arrecadação dos recursos previstos.

Visando seguir esse pensamento, o legislador previu no inciso II do art. 15 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que a aquisição de bens deve ser precedida de sistema de registro de preços.


SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS – CONCEITO
Atualmente, o Sistema de Registro de Preços – SRP encontra-se disciplinado na esfera federal, nos seguintes textos legais: inciso II art. 15 da Lei n.° 8666/93; Decreto n.° 3931/2001 e IN MARE n.° 08/98.

O SRP, como é conhecido, pode ser entendido como uma licitação que tem por objeto o registro do preço de um item, dentro das condições disciplinadas pela Administração, assegurando, em tese, a aquisição de um bem ou prestação de um serviço pelo preço registrado por até um ano.

Note-se que a Lei de Licitações, no art. 15, apresenta a expressão “sempre que possível”, todavia, ao contrário do que os aplicadores do referido texto legal inicialmente entenderam, expressão anteriormente mencionada não é uma aplicação opcional ou facultativa.

A correta interpretação da expressão, segundo Benedicto de Tolosa Filho, corrente da qual somos partidários, revela a determinação do legislador em estabelecer o SRP como regra exigível e em casos excepcionais a adoção de outras formas legalmente estatuídas.

Observe-se que tal entendimento não quer dizer que a Administração somente possa realizar as aquisições de bens ou prestação de serviços através de SRP, porém, é forçoso admitir que principalmente para as aquisições de uso freqüente, o referido instituto é a melhor opção.

A introdução do SRP flexibiliza a aquisição de bens de uso freqüente na medida em que a Administração não é compelida a efetivá-las, como veremos mais adiante, mas o fornecedor é obrigado a fornecê-los.

Outro fator importante é que a Administração, quando os preços registrados se mostrarem superiores ao praticados no mercado, pode realizar licitação paralela, oportunidade que em se demonstrando que os preços estão inferiores aos do registro, fica liberada deste.

Especial atenção merece a conceituação do SRP.

O SRP não é uma modalidade de licitação, mas sim uma forma, uma ferramenta, pela qual a administração garante o preço sem comprometer-se com a contratação.

O mestre Jorge Ulisses Jacoby, in “SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS E PREGÃO PRESENCIAL E ELETRÔNICO” [1], conceitua o SRP como “um procedimento especial de licitação que se efetiva por meio de uma concorrência ou pregão sui generis, selecionando a proposta mais vantajosa com a observância do princípio da isonomia, para eventual e futura contratação pela Administração”.

O mestre Hely Lopes Meirelles[2] conceitua como “o sistema de compras pelo qual os interessados em fornecer materiais, equipamentos ou gêneros ao Poder Público, concordam em manter os valores registrados no órgão competente, corrigidos ou não, por um determinado período e a fornecer as quantidades solicitadas pela Administração no prazo previamente estabelecido”.

Para Diógenes Gasparini[3], o Registro de Preços "é o arquivo de preços de bens e serviços, selecionados mediante concorrência, utilizáveis pela Administração Pública em suas futuras contratações."

Segundo a legislação pertinente, qual seja o Decreto n.° 3931/01, no art. 1°, Parágrafo único, inciso I, “Sistema de Registro de Preços – SRP – conjunto de procedimentos para registro forma de preços relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, para contratações futuras”.


VANTAGENS DA ADOÇÃO DO REGISTRO DE PREÇOS
O Sistema de Registro de Preços apresenta uma série de vantagens e flexibiliza o Poder Público na missão de conciliar as necessidades da Administração com a exigência de licitar e adequar-se a disposição dos recursos orçamentários.

Dentre outras, podemos citar algumas vantagens na utilização do SRP, são elas:

Atender as contingências do orçamento, evitando bloqueio de recursos ou no caso de inexistência destes, garantindo o preço, otimizando assim, a utilização dos recursos orçamentários, haja vista que sua vinculação somente ocorrerá no momento da aquisição ou prestação do serviço e não da abertura do procedimento licitatório;
Atender a determinados tipos de compras que tenham dificuldade de planejamento e demandas imprevisíveis;
Não-obrigação por parte da Administração Pública em contratar;
Obrigação por parte do registrado em garantir o preço salva superveniente e comprovadas alterações dos custos dos insumos;
Disponibilização de espaço de almoxarifado;
Diminuição do número de licitações;
Diminuição de custos de seguro e de armazenamento;
Evitar eventuais riscos de vencimento de prazos de validade;
Manutenção de Preços de bens sujeitos ao efeito da sazonalidade e dos decorrentes de variação climática, como os hortifrutigranjeiros e os grãos, cujos preços oscilam de acordo com a lei da oferta e procura.

O Tribunal de Contas da União, órgão máximo de controle das contas públicas no âmbito federal, orienta que as compras, sempre que possível, sejam realizadas por SRP, principalmente na área da saúde:

“(...) utilize sempre que possível, nas compras efetivadas para os hospitais federais localizados no Rio de Janeiro, o sistema de registro de preços, em obediência ao disposto no art. 15, inciso II, da Lei n.° 8666/93, de maneira a otimizar o processo de aquisição de insumos e obter preços e condições mais vantajosos para a Administração (...)” [4]


HIPÓTESES DE ADOÇÃO DO SRP
O artigo 2° do Decreto n.° 3931/01, disciplina que será adotado o SRP nas seguintes hipóteses:

Art. 2º Será adotado, preferencialmente, o SRP nas seguintes hipóteses:
I - quando, pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações freqüentes;
II - quando for mais conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços necessários à Administração para o desempenho de suas atribuições;
III - quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; e
IV - quando pela natureza do objeto não for possível definir previamente o quantitativo a ser demandado pela Administração.
Parágrafo único. Poderá ser realizado registro de preços para contratação de bens e serviços de informática, obedecida a legislação vigente, desde que devidamente justificada e caracterizada a vantagem econômica.


Analisaremos cada hipótese disciplinada no texto legal acima mencionado.

O inciso I vislumbra a hipótese de contratações freqüentes. Na situação em comento, a Administração sabe que precisará contratar várias vezes o mesmo serviço ou adquirir o bem, mas não sabe com absoluta certeza, em qual momento a contratação será necessária. Para não correr o risco de ter que contratar por emergência (cujos requisitos registrem-se são peculiares e excepcionalíssimos) a Administração poderá realizar uma licitação por SRP, cumprindo a regra de efetuar aquisição ou contratar serviços através de procedimento licitatório e garantindo o preço e contratação imediata para o momento em que efetivamente necessitar realizá-la.

O inciso II salienta a situação em que a Administração precisará que o bem seja entregue parceladamente, isto é, quando a Administração sabe as quantidades que precisará e quando precisará do bem ou da prestação do serviço, todavia, com vistas a otimizar os recursos orçamentários, opta por realizar o SRP, prevendo as futuras contratações. Registre-se, que, segundo nosso entendimento, nada obsta que sejam realizadas licitações com previsão de entrega parcelada, porém, nesse caso, o recurso orçamentário para a pretensa aquisição ou para a prestação do serviço deverá estar previamente disponível, posto que a Administração não pode realizar despesa sem prévio empenho e, excetuando-se a licitação por SRP, a realização de licitação gera para o vencedor uma expectativa de direito em contratar com o Poder Público.

O inciso III disciplina a hipótese em que a aquisição ou a prestação dos serviços vise o atendimento de mais de um órgão ou entidade ou a programa de governo. Na situação em tela, devemos imaginar um projeto que deva ser implantado com a reunião de entidades ou órgãos diferentes da Administração Pública. Nesse caso, a utilização do SRP possibilitará que as aquisições de bens ou prestação de serviços sejam realizadas de uma forma unificada, isto é, o preço será igual para todas as entidades, o que facilitará a administração dos recursos e a posterior prestação de contas não só aos Tribunais de Contas, mas também a sociedade.

Assim preleciona o TCU, sobre o inciso ora discutido:

“(...) O fundamento para a utilização do SRP, nos termos do inciso III do art. 2°, do Decreto n.° 3931/2001 seria a pluralidade de objetos idênticos ou equivalentes. (...)” [5]

O inciso IV talvez o mais utilizado pela Administração, se refere às situações em que a Administração não consegue prever exatamente qual será o quantitativo utilizado pela Administração.

O inciso em comento merece uma especial atenção de nossa parte.

A definição precisa e suficiente do objeto a ser licitado constitui regra “sine qua non” da licitação, até mesmo como pressuposto de igualdade entre os licitantes, constituindo, na hipótese peculiar de aquisição de bens, a quantidade demandada em uma das especificações mínimas e essenciais à definição do objeto, segundo a Súmula 177 do Tribunal de Constas da União.

Entretanto, há objetos que revelam uma situação peculiar em que não se mostra possível precisar com exatidão o quantitativo a ser utilizado. Sendo assim, o que fazer?

A utilização da hipótese fulcrada no inciso IV, do art. 2°, do Decreto n.° 3931/01 atende perfeitamente a necessidade da administração no problema acima mencionado.

Justamente por não haver a obrigação de contratar, as quantidades a serem apostas nos editais de licitações do Sistema de Registro de Preços não precisam ser exatas, isto é, cabe a estimativa, em termos aproximados para um determinado período. Outrossim, a Administração além de não precisar efetivar a contratação, pode, ao fazê-la, não respeitar a totalidade da quantidade estimada em ata.

Todavia, ressalta-se que, ainda que a Administração não esteja vinculada a contratar toda a quantidade registrada em ata, é recomendável que essa estimativa seja realizada de forma mais precisa possível, tendo como parâmetros contratações anteriores e necessidades atuais.

O ideal, segundo o Professor Jorge Ulisses Jacoby, posição este que nos parece ser a mais correta, é que sejam previstas quantidades mínimas e máximas. Tal informação dará aos licitantes um norte das quantidades que poderão vir a ser contratada ao longo da vigência da ata e fazendo com que estes elaborem suas propostas de forma mais realista possível, programando-se com base nas informações apostas no edital licitatório, gerando assim, propostas mais vantajosas para a Administração em vista da economia de escala.

Segundo Marçal Justen Filho[6], “... a incerteza sobre os quantitativos mínimos e máximos se reflete no afastamento dos empresários sérios e na elevação dos preços ofertados à Administração. (...) Dito de outro modo, a Administração deve aproveitar o sistema de registro de preços para obter preços por atacado, evitando os preços de retalho”.

Por último, mas não menos importante tem a hipótese fulcrada no parágrafo único do art. 2°, do Decreto n.° 3931/01, que dispõe sobre a realização de licitação de registro de preços objetivando o fornecimento de bens ou prestação de serviços de informática.

Ressalte-se que a utilização do SRP somente poderá ser realizada a partir do cumprimento dos seguintes pressupostos: obediência à legislação pertinente, isto é, a legislação específica de bens de informática; e, vantagem econômica comprovada.

No que tange a observação à legislação pertinente, não há o que se falar. Em relação aos textos legais específicos de bens informática merece especial atenção o “Direito de Preferência”, concedido através do art. 3° da Lei n.° 8248/91.

Em relação à vantagem econômica, a administração ao optar pelo SRP deve atentar para os seguintes fatores: avaliar os preços que estão sendo obtidos no mercado para encomenda e com prazo de entrega reduzido; verificar se o produto ou serviço está sujeito a grande defasagem tecnológica pela ação do tempo; e, verificar se a finalidade dos produtos ou serviço exige atualidade tecnológica expressiva.


DA PESQUISA DE MERCADO NO SRP
É sabido que anteriormente toda aquisição de bem ou prestação de serviço a ser contratada pela Administração deve ser precedida de ampla pesquisa de mercado.

No SRP não é diferente. Em que pese à licitação se destinar apenas ao registro do preço ofertado, para que o Poder Público não corra o risco de proceder a contratações com o preço superfaturado, a pesquisa de mercado é condição imprescindível para que a mens legis do SRP dê certo na prática.

Disciplina a pesquisa de mercado os art. 3°, inciso IV c/c § 4°, inciso II; art. 12, § 1°, ambos contidos no Decreto 3931/01; e, arts. 6º, 7°, 21 e 22, da IN MARE n.° 08/98.

Assim como nas demais licitações, a pesquisa de mercado efetuada em licitações que objetivam o registro de preço deve ser atual, abrangente, efetiva e parametrizada.

Os artigos 6° e 7° da IN MARE n.° 08/98 disciplinam que a pesquisa de mercado deve:

Realizar-se diretamente no mercado fornecedor, em banco de dados de órgãos ou entidades públicas, em revistas especializadas, índices ou tabelas oficiais, registros do Sistema Integrado de Administração de Serviços – SIASG ou outros meios disponíveis; ou também por intermédio de entidade pública ou privada, com capacitação específica para essa atividade;
Abranger toda e qualquer região do país, inclusive aceitando-se mercado externo (na hipótese de bens importados);
Conter a descrição completa e detalhada do objeto;
Conter as quantidades estimadas de fornecimento;
Conter os prazos máximos, locais e condições de entrega;
Conter as condições de pagamento a serem praticadas
Conter todas as informações que de alguma forma possam interferir na formação do preço.


DA ATA DE REGISTRO DE PREÇOS
A Ata de Registro de Preços é um instrumento jurídico que tem finalidade própria e distinta dos demais elementos do SRP.

Distingue-se do contrato porque esse continua sendo obrigatório, nos casos do art. 62 da Lei n.° 8666/93; não pode ser confundida com a ata da licitação porque essa não tem conteúdo obrigacional vinculativo, destinando-se apenas ao registro do que acontece durante a sessão.

A Ata de Registro de Preços firma o compromisso com vistas à futura contratação, além de especificar preços e condições.

Sobre a natureza jurídica da Ata de Registro de Preços, Eliana Goulart Leão comenta o seguinte:

“... A ata de registro de preços não é um contrato de fornecimento, mas sim um instrumento obrigacional unilateral regido pelo direito público e, sem a conotação de contra-prestacionalidade, própria dos contratos resultantes das licitações comuns...”.[7]


Em síntese podemos dizer que é um documento vinculativo, obrigacional, com característica de compromisso para futura contratação.

O texto legal não estabelece forma específica para o documento em análise. Certo é que a ata deve ser objetiva e concisa. Todavia, deve-se ter em mente que alguns itens são indispensáveis para a sua elaboração, alguns dos quais se encontram dispostos no art. 12, da IN MARE N.° 08/98, tais como:

Nome da Instituição Interessada;
Local, dia e hora da abertura e julgamento do certame;
Número do Processo Administrativo;
Número de Ordem da Licitação;
Objeto e quantidade total estimada;
Órgão Gerenciador;
Órgãos (s) participantes;
Fornecedores com nome e inscrição no CNPJ;
Lista de Itens
Vencedores;
Preço Unitário do primeiro classificado, com menção de que será praticado por todos os demais fornecedores que optarem por aderir a Ata do Registro;
Marcas ofertadas;
Validade da Ata;
Valor total estimado para aquisição;
A menção do compromisso de fornecimento nas condições estipuladas no Edital de Licitação e seus anexos e nas propostas que integrarão a Ata independentemente de transcrição.


DO PRAZO DE VALIDADE DA ATA
Muito se tem discutido acerca do prazo total de validade da Ata de Registro de Preços. O art. 4° do Decreto n.° 3931/2001, assim dispõe:

Art. 4° O prazo de validade da Ata de Registro de Preço não poderá ser superior a um ano, computadas neste as eventuais prorrogações.

Em se tratando de analisar somente o “caput” do referido artigo, não há dúvidas, todavia, o parágrafo segundo do mesmo artigo insere uma questão a ser debatida, a saber:

Art. 4° (...)
§ 2° É admitida prorrogação da vigência da Ata, nos termos do art. 57, § 4°, da Lei n.° 8666/93, de 1993, quando a proposta continuar se mostrando mais vantajosa, satisfeitos os demais requisitos desta norma.

Sendo assim, cabe-nos indagar, as prorrogações de que trata o § 2° estão contidas no prazo disposto no “caput” do mesmo artigo ou não?

Duas posições doutrinárias surgem a respeito do tema.

A primeira refere-se à interpretação estritamente gramatical do texto legal, bem como o raciocínio de que o parágrafo deve ser interpretado de acordo com o estipulado no “caput”. Seguindo por esse prisma, os defensores de tal posicionamento explicitam que a prorrogação de que trata o § 2°, do artigo 4° devem estar contidas nos 12 meses de que trata o “caput” do mesmo artigo, ainda mais porque na redação do “caput”, o texto legal insere a expressão “computadas neste as eventuais prorrogações”.

A Segunda posição, da qual somos partidários, que mais atende as necessidades da Administração e que nos parece mais se adequar a “mens legis” do legislador ao elaborar o SRP, é aquela que defende a validade da ata de registro de preços até 12 (doze) meses, prorrogáveis por mais 12 (doze), caso seja comprovada a vantagem para a administração pública.

O entendimento supra, pode ser corroborado com a alegação de que se assim não estivesse prevendo o legislador, não haveria porque mencionar o art. 57, § 4°, da Lei n.° 8666/93, haja vista que os doze meses que menciona o referido artigo, já estariam contidos no “caput”, do artigo 4°, do Decreto n.° 3931/01.

Tal posicionamento é atualmente a posição majoritária dos administrativistas, dentre os quais podemos citar o mestre Jorge Ulisses Jacoby, que entende da seguinte forma:

“Inovando o Decreto n.° 3931/01 passou a admitir a prorrogação excepcional da atas de registro de preços por até um ano. (...) A excepcionalidade que justifica a aplicação dessa norma foi condicionada a continuar se mostrando vantajosa a aquisição pelo SRP e manutenção dos demais requisitos do Decreto.” [8]

Por oportuno citaremos também o autor Paulo Sérgio de Monteiro Reis que explicita seu entendimento conforme citado abaixo:

“... Outra novidade trazida pelo novo texto foi quanto ao prazo de vigência do registro. A regra continua a mesma: a validade da Ata é de um ano. No entanto, o § 2°, do art. 4° permite a prorrogação da vigência com a utilização das disposições do § 4º do art. 57 da Lei n.° 8666/93, desde que a proposta continue se mostrando a mais vantajosa...” [9]

Segue o já mencionado autor esposando tal entendimento e elencando ainda:

“... Novamente temos aqui uma poderosa arma em mãos da Administração Pública: se o registro de preços estiver se mostrando vantajoso, não só em do preço praticado, como pelo atendimento que vem sendo dado pelo fornecedor, o acordo não precisa ser encerrado, podendo ser prorrogado por até 12(doze) meses...”.[10]

Defendendo a posição doutrinária majoritária sobre a questão da vigência, entendemos da seguinte forma.

Na interpretação da lei, deve-se atender "aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum" (art. 5° da LICC).

Observado que o texto legal é claro e específico ao afirmar que somente poderá ser realizada a prorrogação caso reste comprovada a vantagem econômica para a administração pública, não cabe ao administrador ou aos órgãos jurídicos depreender outro entendimento que não o de possibilitar a referida prorrogação de vigência por 12 (doze) meses além do prazo estipulado no “caput” do art. 4°, do Decreto n.° 3931/01.

Somado a isso se deve atentar para o fato de que o registro do preço em questão foi precedido de licitação, no qual foram respeitados todos os princípios licitatórios tendo sido escolhido aquele que melhor atende a Administração.

Outrossim, o próprio texto legal permite que o documento em questão tenha seus valores alterados, conforme se depreende através de exame perfunctório do art. 12, do Decreto n.° 3931/01 e seus respectivos parágrafos.

Sendo assim, podemos dizer que a posição esposada pela corrente minoritária (a primeira a qual apresentamos) foi um entendimento firmado nos primórdios da publicação do referido Decreto, não devendo, atualmente, encontrar lugar nas “mentes administrativas”, haja vista a quantidade de renomados autores que debruçaram seus esforços na tentativa de elucidar possíveis dúvidas existentes na interpretação do instituto em comento e que divergem completamente do referido pensamento.


DA DIVISÃO POR LOTES
O art. 5° do Decreto n.° 3931/01 traz uma inovação nas compras e serviços a serem realizadas através do Registro de Preços, as divisões totais do item em lotes, observado a quantidade mínima, o prazo e o local da entrega ou da prestação de serviços.

Poucos autores tratam desse assunto especificamente e poucas administrações se utilizam dessa ferramenta.

O mestre Jorge Ulisses Jacoby, in Comentários ao Decreto n.° 3931/01[11], entende que para a correta aplicação do referido dispositivo, o administrador deve considerar os seguintes pré-requisitos:

Os órgãos participantes precisarão do produto apenas uma vez, durante o exercício financeiro?

Se a administração precisar deste produto apenas uma vez, o lote deve ser analisado por três perspectivas: ampliação da competitividade (quanto menor a quantidade prevista nos lotes maior será o número de participantes, haja vista que pequenas empresas também poderão entrar na disputa); aproveitamento dos recursos do mercado (quanto menor for o lote maior a probabilidade de o fornecedor ser local, isto é, fornecedores de outros estados não se interessarão em participar de certames dos quais o a equação custo x benefício não seja a seu favor); e, economia de escala (quanto maior for o lote, maior o ganho para a Administração, haja vista que a presunção de vender em grande escala para a Administração fará com que o licitante opte por diminuir sua margem de lucro e baixar seu preço)


A entrega será parcelada ao longo do período de validade do SRP?

Se a entrega for parcelada, a administração deverá ter em conta o consumo médio mensal, a periodicidade com que são feitas as requisições e a possibilidade de fixação de lotes em vários tamanhos.


Na quantidade de cada órgão participante precisa por mês a compra pode ser tecnicamente dividida em lotes?

Nem sempre a prática usual do mercado permite que a aquisição ou a prestação do serviço seja dividida em lotes. É necessário que a administração sempre se baseie na área técnica para a correta definição.


O tamanho do lote é o que melhor preserva o interesse da economia local e as necessidades de cada órgão participante?

O tamanho do lote é o que melhor representa ganho, em termos de economia de escala para a Administração Pública?

O tamanho do lote do produto justifica, para o fornecedor, o curso da entrega do produto, em razão dos locais de entrega previstos no edital?

Quando o edital previr a entrega ou a prestação de serviço em diversas localidades, faz-se necessária a elaboração de uma tabela por regiões, devendo ser consideradas os locais de entrega como endereço completo, permitindo que os licitantes acresçam custos de frete e armazenamento, cotando preços diferenciados por região.


A partir das respostas obtidas o administrador optará ou não pelo critério de julgamento por menor preço por lote.

Devemos considerar que a exata definição e opção por lotes dependem de uma integração dos setores de compras, gerência de estoque ou almoxarifado e o requisitante.

Isso porque para que o setor de compras possa definir se é mais vantajoso para a administração comprar por lotes ou não precisam ter a informação de como o produto ou o serviço será efetivamente consumido ou prestado e qual a real estimativa de consumo ou custo que provavelmente será realizada a partir de mensuração de anos anteriores, informação esta que somente os outros setores mencionados, que não o setor de compras, será detentora.

Há que se ressaltar, por oportuno, que é indispensável que as quantidades indicadas apresentem uma estimativa real do que a administração irá precisar para que a idéia apresentada no texto legal em comento não venha a ser desacreditada e caia em desuso.

O preço a ser registrado também sofrerá interferências da economia de escala e da primeira lei da economia: oferta e demanda.

Segundo Marçal Justen Filho[12], “... a Administração deverá aproveitar o registro de preços para obter preços por atacado, evitando os preços de retalho. Para tanto, tem de estabelecer lotes que permitam aos potenciais interessados formular a proposta mais vantajosa...”.

Portanto, a definição de lotes deve merecer cuidado e atento estudo por parte da administração, visando à obtenção do ponto de excelência da oferta em seus diversos níveis.


O ÓRGÃO INTERESSADO E NÃO PARTICIPANTE DO SRP – “O CARONA”
A SRP possibilita no art. 8°, do Decreto n.° 3931/01 que órgão ou entidade que não tenha participado do certame licitatório como “órgão gerenciador” (o responsável pela condução do conjunto de procedimentos licitatórios) ou “órgão participante” (aquele que participa dos procedimentos iniciais do SRP e integra a Ata de Registro de Preços), tenha a faculdade de utilização da Ata de Preços durante sua vigência.

A ferramenta do “carona” tem algumas vantagens, uma vez que motiva o uso do SRP, aumentando sua credibilidade, motiva a participação dos fornecedores e prestadores de serviço, haja vista que esses têm a perspectiva de ser contratado sem licitação por outros órgãos da Administração Pública que não tenham participado do SRP.

A idéia do Carona é interessante, todavia, deve ser admitida com algumas reservas, uma vez que é totalmente contrária ao princípio licitatório.

O Carona apenas se beneficia da Ata de outrem a ela aderindo mediante o cumprimento de algumas exigências formais, são elas:

Interesse do Órgão não Participante em usar a Ata de Registro de Preços;
Avaliação Interna do Carona de que os preços do SRP são vantajosos;
Prévia Consulta e Anuência do órgão Administrador[13];
Indicação pelo Órgão Gerenciador do fornecedor com observância da ordem de classificação;
Adesão a uma ata cuja proposta seja igual ou superior a quantidade necessitada
Aceitação pelo fornecedor, da contratação pretendida;
Manutenção de todas as condições oferecidas no registro ao Órgão Gerenciador e ao Órgão Participante.


Muito se tem discutido acerca dos limites da adesão à Ata pelo Carona.

O TCU em recente decisão, no AC 1487/07 – Plenário assim disciplinou levantando a necessidade de revisão do entendimento do referido benefício concedido pela Lei à Administração Pública:

“(...) Entendo na mesma linha defendida pelo Ministério Público, que o Decreto n.° 3931/2001 não se mostra incompatível com a Lei n.° 8666/93 no que tange à utilização do registro de preços tanto para serviços como para compras. Ademais, o art. 11 da Lei n.° 10520/2002 admite a utilização do sistema de registro de preços previsto no art. 15 da Lei de Licitações nas contratações de bens e serviços comuns. (...)
(...) Diferente é a situação da adesão ilimitada a atas por parte de outros órgãos. Quanto a essa possibilidade não regulamentada pelo Decreto n.° 3931/2001 comungo o entendimento da unidade técnica e do Ministério Público que essa fragilidade do sistema afronta os princípios da competição e da igualdade de condição entre os licitantes. (“...)”

Com o entendimento acima esposado, determinou o Egrégio Tribunal de Contas da União no já mencionado AC 1487/2007 – Plenário:

“(...) 9.2. determinar ao Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão que: (...)
9.2.2. adote providências com vistas a reavaliação das regras atualmente estabelecidas para o registro de preços no Decreto n.° 3931/2001, de forma a estabelecer limites para a adesão a registro de preços realizados por outros órgãos e entidades, visando preservar os princípios da competição, da igualdade de condições entre os licitantes e da busca da maior vantagem para a Administração Pública, tendo em vista que as regras atuais permitem a indesejável situação de adesão ilimitada a atas em vigor desvirtuando as finalidades buscadas por essa sistemática, tal como a hipótese mencionada no Relatório e Voto que fundamentam este Acórdão; (...)”


Registre-se que a decisão mencionada ocasionou por parte do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão – MPOG, a impetração de Pedido de Reexame[14] da referida Decisão, que, até março de 2008 ainda não havia sido julgada.

Segundo o MPOG, entre outros pontos salientados no já mencionado pedido de reexame, a adesão ilimitada do Carona não configura ofensa ao princípio da isonomia porque a referida adesão condiciona-se aos seguintes requisitos: que os preços e condições do Sistema de Registro de Preços sejam os mais vantajosos e a aquisição não exceda o limite de cem por cento dos quantitativos registrados na ata.

Depreende-se do esposado que ainda muito se há de falar sobre o assunto, não estando o tema esgotado, mas cabe ressaltar que dois dos mais renomados e importantes autores no âmbito do Direito Administrativo, o mestre Marçal Justen Filho já concluiu seu entendimento sobre a questão:

“... A prática da “Carona” é inválida. Frustra o princípio da obrigatoriedade da licitação configurando dispensa de licitação sem previsão legislativa. (...) não seria exagero afirmar que a prática da “Carona” é intrinsecamente danosa aos cofres públicos, atingindo as raias da improbidade administrativa. (...) sua adoção envolve a assunção do administrador público do risco de produzir uma contratação equivocada (...). ”[15]

Tal entendimento é seguido pelo Mestre Toshio Mukai[16]:

“(...) esses órgãos ou entidades, que, no curso da execução de uma Ata de Registro de Preços, podem adquirir os bens ou serviços licitados pelo órgão gestor e pelos outros convidados a participar, em última análise, estão adquirindo bens ou serviços sem ter participado de qualquer licitação. Eis aí a figura do “carona”, como a doutrina já apelidou esses órgãos ou entidades que, por essa via, compram bens ou contratam serviços sem licitação, o que é frontalmente contra o disposto no inc. XXI do art. 37 da CF. (...)

(...) Na verdade, não pode existir essa figura estranha, denominada “carona”, porque, além do mais é crime “dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade” (art. 89 da Lei n.º 8666/93). (...)

(...) Observa-se, assim, que o art. 8º do Decreto n.º 3931/01, além de possibilitar esse verdadeiro escândalo, criminoso e inconstitucional, ofende frontalmente o princípio do art. 37 da CF e do art. 3º da Lei n.º 8666/93, ou seja, os da igualdade, o da moralidade e o da competitividade.”

Do exame dos parágrafos segundo e terceiro do artigo em comento, podemos concluir que:

O fornecedor não está obrigado a fornecer para o Carona;
O Carona não pode, em seu pedido, exceder em 100% (cem por cento) a quantidade estimada na Ata da qual quiser aderir.


O fornecedor, ao aderir a Ata, não se obriga a fornecer ao Carona posto que tal condição caracterizasse uma exigência excessiva por parte da Administração. O interessado quando participa de um certame deve receber, por parte da Administração, claramente, as condições pelas quais estará sendo submetido.

Ora, se um fornecedor entra em uma licitação achando que estará obrigado a vender para a Administração 1000 unidades de determinado produto, seria justo que após sua contratação, a mesma exigisse 1300 unidades? E se o fornecedor não conseguisse cumprir a referida demanda, deveria ser penalizado?

A resposta para as duas assertivas é negativa. O Contrato deve ser certo e determinado. Quando da adesão à Ata, sabe o fornecedor que deverá ter em seu estoque para pronto fornecimento o quantitativo exigido previamente, mais a margem de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o valor total estimado para o fornecimento, faculdade esta concedida pela legislação à Administração como cláusula especial legal, também tida como cláusula exorbitante.

Todo o quantitativo que exceder ao acima descrito foge às regras legais inicialmente contratadas, sendo assim, não pode o fornecedor ser compelido a assumi-las se não quiser ou não puder.

Entretanto, devem o fornecedor e a Administração estar atento. O Fornecedor não é obrigado a fornecer para o “Carona”, mas uma vez que resolver fornecer, não pode utilizar tal fornecimento como desculpa quando o órgão gerenciador da Ata ou o órgão participante fizer alguma requisição e o mesmo não tenha o produto para pronto fornecimento.

As contratações são diversas e, o pedido feito pelo “Carona” não desobriga o fornecedor as quantidades inicialmente estimadas em ata e a margem de acréscimo permitida por lei à administração.

Portanto, registre-se, o fornecimento ao Carona é faculdade e não obrigação do fornecedor.

Igualmente, outra questão importante diz respeito às quantidades.

Por que necessariamente deve o Carona respeitar as quantidades máximas estimadas, haja vista que a Contratação será feita à parte do órgão gerenciador ou do órgão participante?

Simples.

A adesão do Carona à Ata de Registro de Preços configura para o mesmo em exceção à regra de licitar. Tal exceção, bem verdade, é expressamente permitida por lei, mas exatamente por ser hipótese de exceção deve estar submetida a determinados critérios.

Se o ordenamento jurídico não impusesse o limite quantitativo, a Administração antes de efetuar qualquer compra ou contratação de prestação de serviço, consultaria no sistema acerca da existência de atas que tivessem objetos do seu interesse e não procederia a licitação.

Assim procedendo, seria fácil observar o fracionamento de despesas e poderíamos ter órgão ou entidades contratando com preços superfaturados. Devemos ter sempre em mente, uma regra muito utilizada no âmbito comercial, qual seja, quanto maior a demanda, menor o preço.

Sendo assim, se um órgão adquirir produto de uma ata na qual a quantidade máxima exigida por de 10.000 unidades, para suprir uma demanda de 10.000.000, logicamente estará comprando o produto por um preço infinitamente maior do que aquele que conseguiria se houvesse realizado uma licitação junto ao mercado fornecedor.

Destarte, a princípio parecer uma norma por demais restritiva, haja vista a permissão legal, na verdade o legislador quis com isso evitar que o administrador seja “tentado a” descumprir os princípios legais e básicos da Administração Pública, quais sejam o da legalidade e da eficiência.


DA ESTIMATIVA DE QUANTIDADE
Fundamentam a exigência de quantitativo, o art. 12, inciso I, da IN MARE n.° 08/98 e o art. 9°, inciso II, do Decreto n.° 3931/2001.

Observa-se a simetria das normas acima com a disposta no art. 15, § 7°, inciso II, da Lei n.° 8666/93, a saber:

“Art. 15 (...)
§ 7° (...)
II – a definição das unidades e das quantidades a serem adquiridas em função do consumo e utilização prováveis, cuja estimativa será obtida, sempre que possível, mediante adequadas técnicas quantitativas de estimação;”


Conclui-se, portanto, que a necessidade de previsão de estimativa de quantidade depreende-se de uma norma legal que não pode ser inobservada, haja vista a incessante preocupação do legislador em registrá-la em vários textos legais.

A estimativa faz-se necessária posto que, apesar da administração não ter como exigência a prévia alocação de recursos orçamentários para a realização de licitação, ela deve ter ao menos uma base de quanto provavelmente virá a gastar com aquele item a ser adquirido ou o serviço a ser prestado.

Outrossim, por parte do fornecedor, o mesmo deve ter uma noção de quanto terá que vir a fornecer, caso seja contratado, ou quantas vezes provavelmente irá prestar o serviço.

Muito se tem debatido acerca da necessidade de estipulação da mencionada estimativa.

O que se deve ter em mente é que a definição de quantidades máximas que podem ser adquiridas visa assegurar a prevalência do interesse público buscado pela Administração, que terá não só a elasticidade de comprar menos do que inicialmente previu, mas também, feita uma correta estimativa, alcançar preços realmente vantajosos, economizando assim o erário.

Alguns autores, entre os quais o mestre Jorge Ulisses Jacoby, entendem inclusive, que caso seja necessário e mais vantajoso para a Administração, essa pode viabilizar não só a apresentação da quantidade total máxima, mas também a mínima a qual o administrador se propõe a pagar. A saber:

“(...) NO SRP, ao contrário, o que vigora é um sistema em que a flexibilidade das aquisições constitui o ponto forte em favor da Administração e dos fornecedores.
Assim, em princípio, não se mostra favorável a garantia de aquisição de um mínimo, salvo se:
1. A administração tiver certeza da concretização de determinada quantidade;
2. Houver probabilidade de aumentar a vantagem em termos de preços.

Concluindo, não é ilegal estabelecer o quantitativo mínimo ao qual se obriga a Administração adquirir, mas sua conveniência deve ser analisada com cautela. (...)” [17] (grifo nosso)

Tal situação possibilita um conforto maior ao fornecedor que não sabe se vai fornecer todo aquele quantitativo estimado, mas tem a certeza de que ao menos a quantidade mínima será adquirida pela administração, fazendo com que haja maior interesse do mercado em participar de licitações cujo objeto seja registrar o preço e não efetivamente a compra ou a prestação de serviço.

Tal entendimento tem seguido os Tribunais.

O Tribunal de Contas do Estado de Rondônia suspendeu o certame licitatório – decorrência de registro de preços, objetivando a aquisição de remédios – tendo em vista, dentre outras irregularidades, a ausência de documentos que definissem as “unidades e as quantidades a serem adquiridas em função do consumo e utilização prováveis, obtidos mediante adequadas técnicas de estimação.” [18]

O Tribunal de Contas da União assim se pronunciou:

“(...) Ainda cabe relevar que o Decreto que regulamenta o Sistema de Registro de Preços realmente prevê a adoção de registro de preços para os casos em que não for possível definir previamente o quantitativo a ser demandado pela Administração, entretanto, entendemos que isto não significa que o órgão deve deixar de fazer a estimativa de quantidades a serem adquiridas no prazo de validade do registro, conforme exige o inciso II do art. 9° do Decreto. (...)” [19]


“(...) 2. A avaliação do custo do serviço pela Administração deve ser feita por meio de orçamento detalhado, considerados os preços e as especificações em prática no mercado. (...)” [20]


Nesse sentido cabe esposarmos o entendimento de Marçal Justen Filho, entendimento este do qual somos partidários, acerca do tema:

“(...) O projeto deverá obrigatoriamente estimar as quantidades a serem adquiridas. O ato convocatório deverá ater-se fielmente ao projeto. Haverá casos em que inexistirão condições técnico-científicas para definir as quantidades. Ainda nessas hipóteses, será proibida a licitação de quantidades indefinidas. Deverá promover-se uma estimativa dentro dos limites que a técnica permita formular. Se no curso do contrato, verificar-se a inadequação dos cálculos serão adotadas as providências adequadas. (...)” [21]


Ainda no tocante ao tema, o já citado autor discorre:

“(...) A quarta vantagem reside na definição de quantidades e qualidades a serem contratadas. Em uma licitação comum, a Administração tem o dever de fixar, no ato convocatório, as quantidades e as qualidades dos produtos que contratará. A redução ou ampliação de quantidades está sujeita aos limites do art. 65, § 1°. A alteração da qualidade não poderá alterar substancialmente o objeto licitado.
Num sistema de registro de preços, a Administração estima quantidades máximas e mínimas. Posteriormente, estará autorizada a contratar as quantidades que forem adequadas à satisfação das necessidades coletivas. Isso não significa discricionariedade na fixação de quantitativos, tal como se apontará abaixo. Não se admitem quantificações indeterminadas nem a remessa da fixação do quantitativo à escolha subjetiva da Administração (...)”.[22]

Mais adiante:

“(...) É imperioso determinar os quantitativos máximos cuja aquisição se prevê no período de um ano. Mas, além disso, deverão estabelecer-se os quantitativos para cada aquisição individual. Por outro lado, não se pode admitir formulação genérica para os lotes. Não será válida previsão de que os quantitativos em cada aquisição serão fixados discricionariamente, sem qualquer limite pela Administração. Será defeituoso, por exemplo, o edital que estabelecer que a Administração poderá requisitar o fornecimento de lotes entre um quilograma e dez toneladas. Ora, isso inviabiliza a formação de preços, atemoriza os fornecedores diligentes e estimula os imprudentes. Além de ter outros efeitos como se verá abaixo. Em suma, a adoção de registro de preços não significa afastar a previsão de que os editais devem descrever de modo preciso o objeto da licitação.

Ou seja, o sistema de registro de preços não pode gerara a ampliação dos custos de transação do particular[23]. A incerteza sobre os quantitativos mínimos e máximos se reflete no afastamento dos empresários sérios e na elevação dos preços ofertados à Administração. Basta um pequeno exemplo para evidenciar o problema. É possível formular um juízo aplicável a qualquer objeto, numa sociedade industrial razoavelmente desenvolvida. Trata-se do princípio da escala, que significa que quanto maior a quantidade comercializada tanto menor o preço unitário dos produtos fornecidos. Assim, o preço unitário não será o mesmo para fornecer um quilo de açúcar ou dez toneladas. Se não for estabelecido um lote mínimo para requisição, o particular se verá num dilema econômico invencível. Seus custos serão diversos em função das quantidades. O resultado será a formulação de preços médios. Logo sempre que a Administração formular requisição de lotes de maior dimensão acabará pagando valor superior ao que poderia ter obtido – se o licitante dispusesse da informação sobre a dimensão dos lotes.

Dito de outro modo, a Administração deve aproveitar o sistema de preços para obter os preços por atacado, evitando os preços de retalho. Para tanto, tem de estabelecer lotes mínimos que permitam aos potenciais interessados formular a proposta mais vantajosa.
Por outro lado, a fixação de quantitativos máximos é imposição essencial, derivada das normas orçamentárias, do princípio da isonomia e da economicidade. (...) “[24]


DO PREÇO MÁXIMO QUE A ADMINISTRAÇÃO PRETENDE PAGAR
Outra questão controvertida na doutrina e entre os aplicadores do SRP é a questão do preço unitário máximo que a Administração pretende pagar.

O debate decorre da exigência prevista no art. 9°, inciso III, do Decreto n.° 3931/2001 e do art. 5°, inciso III, da IN MARE n.° 08/98.

Afinal, o texto legal dispõe que a Administração deve informar o preço máximo que pretende pagar pelo item a ser registrado.

Tal exigência é justa?

Em não se tratando de questão de justiça, a exigência prevista no texto legal é comercialmente aplicável? Ou é por demais desvantajosa para a Administração Pública?

Se perguntarmos aos operadores do Sistema de Registro de Preços, esses responderão em uma só voz que a divulgação do preço máximo pela qual a Administração se propõe a pagar é por demais desvantajosa para a Administração Pública.

Segundo os mesmo, os fornecedores de posse dessa informação não reduzem seus preços o quanto poderia (desde que estes estejam abaixo daquilo que a Administração se propõe a pagar, é bem verdade) e isso tira o poder de barganha da administração, posto que, em uma licitação pela modalidade de pregão, por exemplo, sabendo que seu preço está dentro daquele estimado pela Administração como máximo, o fornecedor se não houver muitos concorrentes não se interessará em oferecer lances menores, porque tem praticamente certeza de que seu preço da será registrado da forma que foi oferecido.

Se assim acontecer, a administração pública não necessariamente estará comprando pelo menor valor, mas sim, apenas dentro do valor estimado e com isso poderá estar descumprindo o princípio da eficiência.

Avaliando a posição com cautela e em que pese estar previsto na legislação, acatamos o posicionamento dos operadores do SRP e entendemos que assinalar na minuta de Edital o valor máximo que a administração pretende pagar, realmente é prejudicar a fase de lances do certame (no caso de licitação na modalidade de pregão) e ferir os princípios da economicidade, escolha da proposta mais vantajosa para a Administração Pública e da eficiência.

Todavia, não há como simplesmente desprezar a exigência da norma.

Sendo assim, concordamos com o entendimento dos Setores de Compras dos órgãos públicos que explicitam que o cumprimento a referida exigência se daria na instrução processual e não na minuta de Edital.

Como se daria tal situação?

A mera elaboração do Mapa Comparativo de Custos, por si só gerará um preço que, de acordo com os critérios utilizados, o que geralmente é o de menor preço, deverá ser tomado como parâmetro para a realização das negociações.

Sendo assim podemos dizer que este será o preço máximo pelo qual a Administração se dispõe a pagar.

Todavia, tal documento constará apenas do processo administrativo e tal informação não estará no instrumento editalício.

Se assim o fizer, podemos dizer que a Administração não estará ferindo a legislação, haja vista que estará informando o preço máximo que se dispõe a pagar e levando-se em conta de que o processo administrativo do qual a pretensa licitação faz parte é público, qualquer interessado que quiser saber o referido preço deverá ir até o órgão gerenciador e, pedindo vistas do processo, poderá ter acesso ao já mencionado Mapa Comparativo.

Tal entendimento foi exemplificado em alguns acórdãos do Tribunal de Contas da União, a saber:

“(...) nos procedimentos licitatórios par aquisição de produtos e contratação de serviços de informática, anexe aos instrumentos convocatório o orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários, ressalvada a modalidade de pregão, cujo orçamento deverá constar obrigatoriamente do Termo de Referência, ficando a critério do gestor, no caso concreto, a avaliação da oportunidade e conveniência de incluir tal Termo de Referência ou o próprio orçamento no edital ou de informar nesse mesmo edital, a disponibilidade de orçamento aos interessados e os meios para obtê-los. (...)” [25]

O entendimento vislumbrado no acórdão anteriormente mencionado é seguido e, portanto, confirmado em outra decisão, qual seja:

“(...) O entendimento que prevaleceu na oportunidade, reflete a meu ver, o espírito da lei do pregão. Primeiro porque do termo de referência, documento que integra o processo administrativo da contratação deverá constar orçamento detalhado, considerados os preços de mercado[26]·. Segundo porque não há exigência de orçamento detalhado em planilha de custos como na Lei n.° 8666/93. Terceiro porque ficará a critério do gestor no caso concreto, a avaliação da oportunidade e conveniência de incluir tal termo de referência ou o próprio orçamentos aos interessados e os meios para obtê-los. Quarto porque permite ao pregoeiro obter, na fase de lances e de negociação do pregão, preços inferiores àqueles resultantes da pesquisa realizada. Por último porque o acesso ao orçamento estará assegurado aos licitantes que solicitarem vista do processo.” [27]


DA ALTERAÇÃO DA ATA DE REGISTRO DE PREÇOS – REVISÃO DE PREÇOS E QUANTIDADES
Segundo art. 12 do Decreto n.° 3931/2001 permite-se alterar a Ata de Registro de Preços de acordo com o art. 65 da Lei n.° 8666/93.

Tal peculiaridade se dá com vistas a conceder maior flexibilidade à Ata de SRP para que esta esteja, dentro de sua validade, de acordo com as variações da economia de mercado.

Para melhor exemplificar as hipóteses de alteração, iremos analisar cada parágrafo separadamente.

Reza o § 1° do artigo em comento:

“Art. 12 (...)
§ 1°. O preço registrado poderá ser revisto em decorrência de eventual redução daqueles praticados no mercado, ou de fato que eleve o custo dos serviços ou bens registrados, cabendo ao órgão gerenciador da Ata promover as necessárias negociações junto aos fornecedores. (“...)”


O dispositivo ora analisado deixa clara a necessidade de que freqüentemente sejam realizadas pesquisas de mercado para que a administração possa verificar se a Ata ainda encontra-se vantajosa ou não para utilização.

É bem verdade que, dependendo da demanda do órgão gerenciador da Ata essa verificação não será feita com a freqüência ideal, mas é imprescindível que ao menos antes de se utilizar do referido documento, a Administração proceda uma pesquisa de preços junto ao mercado para analisar se os preços registrados ainda estão válidos.

Alguns autores, como Jorge Ulisses Jacoby[28], entendem que a revisão prevista, em que pese ter a conotação de que opera para mais e para menos, só pode ser realizada para menos.

Ousamos discordar do renomado autor, haja vista que se relermos a disposição constante do “caput” do referido artigo, a Ata poderá ser alterada nos termos do art. 65, da Lei n.° 8666/93 e baseado no referido artigo, pode-se realizar o instituto do re-equilíbrio econômico financeiro para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente.

A equação econômico-financeira se delineia a partir da elaboração do ato convocatório. Porém, a equação se firma no instante em que a proposta é apresentada. Aceita a proposta pela Administração, no momento da realização do contrato, está consagrada a equação econômico-financeira dela constante. A partir de então, o equilíbrio dessa equação está protegido e assegurado pelo direito.

O equilíbrio econômico-financeiro abrange todos os encargos impostos à parte, ainda quando não se configurem como “deveres jurídicos”, propriamente ditos.

Como preleciona Celso Antônio Bandeira de Melo “... as obrigações contratuais hão de ser entendidas como o estado de coisas ao tempo em que se contratou. Em conseqüência, a mudança acentuada dos pressupostos de fato em que se embasaram implica alterações que o Direito não pode desconhecer.”

Não fosse assim, ninguém contrataria, pois a instabilidade lesaria uma ou ambas as partes. Com efeito, o ente governamental seria prejudicado se a variação beneficiasse o particular e este seria onerado se a instabilidade favorecesse àquele.

É em razão de tais fatos que a doutrina, a uma só voz, tem afirmado que a equação econômico-financeira do contrato administrativo constitui-se no mais legítimo direito do contratado. Desse entendimento corroboram Celso Antônio Bandeira de Melo, Lucia Valle Figueiredo e no mesmo sentido vem decidindo os nossos Pretórios, a exemplo:

“A garantia da manutenção do equilíbrio econômico e financeiro dos contratos administrativos é tema acerca do qual inexiste controvérsia no âmbito da doutrina autorizada. (TRF 1ª Região – RDA 190:185 voto Juiz Vicente Lea l).”


Direito à equação econômico-financeira significa a preservação durante toda a vigência do contrato administrativo, da igualdade entre os encargos da execução sob a responsabilidade do contratado e a remuneração devida pela Administração Pública contratante.

O instituto do re-equilíbrio econômico-financeiro, embora direito do contratado, exige certos requisitos para sua configuração, a saber:

elevação dos encargos do particular;
evento posterior à formulação da proposta, identificável como causa do agravamento da posição do particular;
vínculo de causalidade entre o evento ocorrido e a majoração dos encargos do contratado; e;
que a elevação dos encargos não derive de conduta culposa imputável ao particular e remuneração proporcional à majoração dos encargos.

De fato, fatores de ordem econômica, alheios à vontade dos co-contratantes, podem repercutir no contrato administrativo e causar desequilíbrio insuportável na relação encargo/remuneração. São as chamadas áleas econômicas extraordinárias e extracontratuais.

É forçoso admitir que a Ata de Registro de Preços não é um contrato em seu conceito rudimentar, mas tendo em vista que ao assinar a Ata o fornecedor se compromete a fornecer o produto ou prestar o serviço pelo preço registrado, podemos dizer também que este “termo de compromisso” pode se socorrer do instituto do re-equilíbrio econômico financeiro, que se registre, admite tanto re-equilibrar-se para um valor maior quanto para um valor menor.

Caso verifique-se que os preços registrados estão acima dos encontrados no mercado, o administrador socorrer-se-á do disciplinado no parágrafo segundo e deverá convocar o fornecedor visando a negociação para redução de preços e sua adequação ao praticado pelo mercado, liberando-se o fornecedor caso o mesmo não aceite a redução do preço ou, em se tratando de liberação do primeiro fornecedor, chamar os demais para a realização da mesma negociação.

Quando ocorrer a majoração do preço de mercado em face dos preços registrados, hipótese esta em que o Mestre Jorge Ulisses Jacoby não admite a revisão dos preços registrados, o parágrafo terceiro do art. 12, do Decreto n.° 3931/2001 dispõe que o fornecedor deve requerer à administração, munido com os documentos comprobatórios da referida majoração, que a administração o libere do compromisso assumido.

Disciplina ainda o referido texto que a administração deverá convocar os fornecedores oferecendo “igual oportunidade de negociação”.

Observe-se que o texto legal fala em “requerimento”, “documentos comprobatórios da majoração” “que os fatos tenham ocorrido antes do requerimento” e “igual oportunidade de negociação”.

Não seriam estes requisitos constantes do re-equilíbrio econômico financeiro?

Em caso positivo, porque ao constatar-se a veracidade dos fatos elencados pelo particular e verificado que ainda encontra-se vantajoso manter o preço do fornecedor, não proceder ao re-equilíbrio da Ata de Registro de Preços, evitando assim, gastos com a realização de nova licitação correndo o risco de registrar preço superior ao apresentado pelo fornecedor já registrado?

Permissa vênia aos que pensam ao contrário entendemos que devidamente justificado e anexado ao processo administrativo o documento comprobatório da majoração, poderá o administrador proceder à revisão dos preços registrados para se adequarem às condições inicialmente formalizadas.

O quarto parágrafo do art. 12, do Decreto n.° 3931/2001 dispõe sobre a hipótese de revogação da Ata sem que haja qualquer tipo de penalidade para os fornecedores.


DA CONTRATAÇÃO
Passemos agora a fase de efetiva contratação do preço registrado.

Disciplina o art. 11, do Decreto n.° 3931/2001:

“Art. 11 A Contratação com os fornecedores registrados, após a indicação pelo órgão gerenciador do registro de preços, será formalizada pelo órgão interessado, por intermédio de instrumento contratual, emissão de nota de empenho de despesa, autorização de compra ou outro instrumento similar, conforme o disposto no art. 62, da Lei n.° 8666/93.”


Disciplina o art. 62, da Lei n.° 8666/93:

“Art. 62. O instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.

§ 1° A minuta do futuro contrato integrará sempre o edital ou ato convocatório da licitação.

§ 2° Em "carta contrato", "nota de empenho de despesa", "autorização de compra", "ordem de execução de serviço" ou outros instrumentos hábeis aplica-se, no que couber, o disposto no art. 55 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)

(...)

§ 4o É dispensável o "termo de contrato" e facultada a substituição prevista neste artigo, a critério da Administração e independentemente de seu valor, nos casos de compra com entrega imediata e integral dos bens adquiridos, dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive assistência técnica.”


Da análise conjunta dos dois artigos, pode-se perceber que em se tratando de compra com entrega imediata e integral dos bens adquiridos, dos quais não resultem obrigações futuras, poderá ser dispensado o instrumento contratual.

Todavia, não se deve esquecer que para a não utilização do termo de contrato, deve ser observado o parágrafo segundo do artigo 62, da Lei n.° 8666/93, isto é, deverão constar de um documento formal as cláusulas necessárias constantes do art. 55, da Lei n.° 8666/93.

Ressaltamos aqui, entendimento esposado pela Procuradoria Federal da Fundação Oswaldo Cruz, através do Procurador Federal Luiz Otávio Laxe Vilela que entende que “... como a ICNE é considerada instrumento hábil para a substituição do termo de contrato, nada impede que a Ata do Registro de Preços também venha a ser utilizada com esta finalidade, desde que a situação esteja contemplada nas hipóteses previstas no § 4° e no caput do art. 62 supracitado, e que a ata contemple, no mínimo, as exigências contidas no § 2° do mesmo artigo.” [29]

E quanto ao “carona”, quando decidir aderir ao sistema de registro de preços de outro órgão ou entidade pública de cujo procedimento licitatório não participou, este tem a faculdade ou o dever de utilizar o instrumento de contrato adotado pelo órgão gerenciador do sistema?

Em caso de obrigatoriedade, o instrumento previamente apreciado pela assessoria jurídica do órgão gerenciador pode se objeto de análise e eventual mudança pela assessoria jurídica do “carona”?

Quanto ao primeiro questionamento, entendemos que ao tomar a decisão de se utilizar da Ata existente, o “carona” implicitamente adere às condições impostas àquele certame, sendo uma delas o instrumento contratual utilizado como modelo para as contratações advindas daqueles SRP.

Sendo assim, não pode o “carona” utilizar-se de seu próprio modelo contratual, devendo seguir o modelo apresentado pelo órgão gerenciador, modelo este que foi previamente analisado também pelo fornecedor, podendo inclusive ter sido motivo de impugnação à época oportuna.

Quanto ao segundo questionamento, entendemos que por força do art. 38, parágrafo único, da Lei de Licitações, que exige prévia análise pelo órgão jurídico da entidade nos instrumentos contratuais a serem firmados pela mesma, a análise da assessoria jurídica da entidade que será “carona” não poderá ser prescindida.

Isso porque não basta a presunção de validade do instrumento contratual, já que previamente aprovado pelo jurídico do órgão gerenciador. É necessário que a assessoria do ente contratante, nesse caso o “carona” faça uma análise da legalidade da contratação em concreto, que não apenas abrange as cláusulas contempladas no respectivo instrumento, mas também outros aspectos como, a disponibilidade orçamentária e a legalidade da representação da pretensa contratada.

Portanto, entendemos indispensável o prévio exame e aprovação do contrato celebrado por órgão não participante do SRP por sua respectiva assessoria jurídica, ainda que o respectivo instrumento já tenha sido submetido à apreciação do órgão jurídico do ente gerenciador do SRP.


DA APLICAÇÃO DE PENALIDADES
Analisando-se o procedimento especial do Sistema de Registro de Preços podemos assinalar diferentes momentos de penalidade.

O artigo 28 do Decreto n.º 5450/05, texto legal que rege o Pregão Eletrônico, estabelece várias fases em que o fornecedor pode ser penalizado. Diz o referido dispositivo:

“Art. 28. Aquele que, convocado dentro do prazo de validade de sua proposta, não assinar contrato ou a ata de registro de preços, deixar de entregar documentação exigida no edital, apresentar documentação falsa, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo, fizer declaração falsa ou comprometer fraude fiscal garantido o direito à ampla defesa, ficará impedido de licitar e de contratar com a União e será descredenciado no SICAF, pelo prazo de até cinco anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais.”


Poderá ser penalizado aquele que, participando do Pregão, deixar de entregar documentação obrigatória previamente exigida no Edital ou apresentar condições na proposta as quais não pode cumprir fazendo com que incorra nas situações previstas no art. 28 do Decreto n.º 5450/05, quais sejam: “... ensejar o retardamento da execução de seu objeto...” e/ou “... não mantiver sua proposta...”.

Finda a sessão do Pregão, aquele fornecedor que sagrar-se o vencedor e for convocado dentro do prazo de validade de sua proposta, caso recuse-se a assinar a ata de registro de preços poderá ser penalizado com o impedimento de licitar e contratar com a União por até cinco anos.

Assinada a Ata, passamos a um tipo de penalização somente existente no SRP. O fornecedor ser penalizado com o cancelamento de seu registro do SRP.

O artigo 13 do Decreto n.º 3931/01 disciplina as hipóteses em que o fornecedor terá seu registro cancelado. São elas:

a. Descumprir as condições da Ata de Registro de Preços;
b. Não retirar a respectiva nota de empenho ou instrumento equivalente, no prazo estabelecido pela Administração, sem justificativa aceitável;
c. Não aceitar reduzir o seu preço registrado, na hipótese de este se tornar superior àqueles praticados no mercado; e,
d. Tiver presentes razões de interesse público
e. Quando por ocorrer fato superveniente que venha a comprometer a perfeita execução contratual, decorrentes de caso fortuito ou de força maior devidamente comprovado.


Das cinco situações somente as duas últimas não se configuram propriamente uma penalização. Todavia, registre-se que na situação mencionada à letra “e”, o cancelamento do registro e liberação do fornecedor das obrigações assumidas em ata, dependerá da aceitação por parte da Administração dos fatos alegados pelo detentor do registro, caso contrário, caso seja feito algum pedido de fornecimento de bem ou prestação de serviço ao fornecedor e este recusar-se a cumprir estará incorrendo nas situações previstas nas alíneas “a” e “b”.

Salientamos, por oportuno, que nas duas primeiras hipóteses além do registro cancelado, o fornecedor também está sujeito as penalidades previstas não só na Lei n.º 10520/02 (caso a licitação tenha sido na modalidade de Pregão Presencial), mas também no Decreto n.º 5450/05 (caso tenha sido realizado um Pregão na forma eletrônica) e na Lei n.º 8666/93 (aplicável em todas as modalidades de licitação, ainda que subsidiariamente), posto que as situações mencionadas caracterizem, analogicamente, o descumprimento de cláusulas contratuais.

A situação descrita na letra “c” caracteriza uma penalidade “branca”, isto é, o fornecedor na hipótese em que o preço do registro torna-se superior ao praticado no mercado é convocado pelo órgão gerenciador da Ata a negociar seu preço de forma que o mesmo sofra redução e se iguale ao praticado no momento atual. Nesse caso, o detentor do preço registrado em primeiro lugar não é obrigado a reduzir seu preço, mas se não o fizer terá seu preço motivadamente cancelado.

Por isso mencionamos como uma penalização “branca”, na medida em que o texto legal não configura tal hipótese como uma penalidade, mas também, comercialmente falando, é uma forma de pressionar o fornecedor a adequar-se às vontades do poder público e, de certa, forma penalizá-lo caso não o faça, posto que apesar de não descumprir nenhuma das condições editalícias ou previamente previstas na proposta comercial se verá impedido de fornecer o bem objeto da licitação de SRP.

O parágrafo primeiro do artigo 13 do Decreto n.º 3931/01 estabelece que seja assegurado o contraditório e a ampla defesa, assim como em qualquer procedimento de aplicação de penalidade administrativa, e que o cancelamento do registro será formalizado por despacho da autoridade competente do órgão gerenciador.

Sendo assim, cabe-nos indagar: somente o órgão gerenciador pode aplicar penalidade?

Entendemos que a penalidade de cancelamento de registro somente pode ser aplicada pelo órgão gerenciador por força do especificado no parágrafo primeiro do artigo 13 do Decreto n.º 3931/01, todavia, as penalidades a serem aplicadas por força de descumprimento total ou parcial de contrato podem ser aplicadas tanto pelo órgão gerenciador quanto pelo órgão participante e até mesmo pelo órgão não participante, o carona.

Isto se dá porque cada pedido deve ser encarado como uma contratação una e como tal está estritamente ligada às suas partes interessadas, isto é, o órgão que procedeu ao pedido e o fornecedor.

Contudo, somos partidários do entendimento que o órgão gerenciado deva ser comunicado da penalidade que será aplicada ao fornecedor para que o mesmo possa atuar conjuntamente com os demais procedendo diligentemente a gerência da Ata efetuando, inclusive, o cancelamento do registro do fornecedor penalizado, caso entenda ser suficientemente graves os fatos para a adoção da referida sanção.


CONCLUSÃO
Por todo o exposto e por todas as peculiaridades presentes no SRP percebemos que se trata de uma importante ferramenta para a agilidade nas compras públicas, facilitando assim que a administração eficazmente o princípio da eficiência, exigido pelo artigo 37 da Lei Maior.

O momento em que estamos vivendo não mais comporta procedimentos administrativos altamente burocráticos, com uma infindável circulação de papéis e inúmeras manifestações hierárquicas. A atuação estatal, para adquirir força e representatividade no mercado não pode se valer somente da supremacia do interesse público em face do interesse privado.

Urge que a administração seja rápida para poder acompanhar as grandes transformações que se operam, dia a dia, em decorrência da globalização e do rápido desenvolvimento tecnológico.

O sistema de registro de preços se corretamente adotado poderá contribuir e muito para que isso se torne possível.

Para finalizar citamos o brilhante pensamento da autora Eliana Goulart Leão, do qual somos integralmente partidários:

“(...) contrariando entendimentos equivocados que existiram até agora, que o sistema de registro de preços não é um “arquivo”, “quadro” ou “lista de preços”. Pelo simples fato de sua adoção autorizar a Administração a realizar suas compras, constitui ele, sem dúvida nenhuma, um procedimento especial de licitação e contratação (...). ”[30]

Bibliografia
Fernandes, J. U. (2003). Sistema de Registro de Preços e Pregão Presencial e Eletrônico (1 ed.). Belo Horizonte: Forum.
Fernandes, J. U. (2005). Sistema de Registro de Preços e Pregão Presencial e Eletrônico (2 ed.). Belo Horizonte: Forum.
Filho, M. J. (2002). Comentários à Lei de Licitações e Contratações Públicas (9º Edição ed.). São Paulo: Dialética.
Filho, M. J. (2002). Comentários à Lei de Licitações e Contratações Públicas (11 Edição ed.). São Paulo: Dialética.
Filho, M. J. (2002). Comentários à Lei de Licitações e Contratações Públicas (10 Edição ed.). São Paulo: Dialética.
Gasparini, D. (1995). Direito Administrativo. Saraiva : Rio de Janeiro.
Leão, E. G. (1996). O Sistema de Registro de Preços. Campinas: Bookseller.
Meirelles, H. L. (1990). Licitações e Contratos Administrativos (1 ed.). Rio de Janeiro: Saraiva.
Mello, C. A. (2004). Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros.
Revista "O PREGOEIRO". (Junho / Outubro / Novembro / Janeiro de 2007 / 2008). São Paulo, São Paulo, Brasil: Editora Negócios Públicos do Brasil.
Zenite. (s.d.). Acesso em 19 de Dezembro de 2007, disponível em ZENITE: www.zenite.com.br




[1] JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Sistema de Registro de Preços e Pregão Presencial e Eletrônico. 2 ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005.
[2] Licitação e Contratos Administrativos. 1. ed. Saraiva, 1990. p. 48.
[3] Direito Administrativo. Saraiva, 1995. p. 298.
[4] AC 1095/07 – Plenário. Classe VII – Relator: Ministro Marcos Vilaça – FISCALIZAÇÃO – ACOMPANHAMENTO CONGRESSO NACIONAL
[5] AC 2392/06 – Plenário. Sessão 06/12/06. Classe VII – Relator: Ministro Benjamin Zymler – FISCALIZAÇÃO - REPRESENTAÇÃO
[6] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratações públicas. 9ª ed. São Paulo. Dialética, 2002. p.162.
[7] LEÃO, Eliana Goulart. O sistema de registro de preços. Campinas: Bookseller, 1996, p. 70.
[8] in “COMENTÁRIOS AO DECRETO N.° 3931/01”, retirado do site http://www.zenite.com.br
[9] in “A NOVA REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS FEDERAL”, retirado do site: http://www.zenite.com.br
[10] Idem nota 9.
[11] JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Comentários ao Decreto n.° 3931/01. retirado do site da Zênite. http://www.zenite.com.br
[12] JUSTEN FILHO, Marçal. In “Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 11 ed.
[13] no tocante a anuência do órgão administrador, data máxima vênia de alguns renomados autores, ousamos discordar no entendimento de que o órgão gerenciador tem o poder de permitir ou não que o Carona participe da Ata de Registro de Preços. Não há por exigência legal, a necessidade de controle por parte do órgão gerenciador, haja vista que a legislação menciona apenas “prévia consulta”, devendo se ter em mente de que a consulta da qual a legislação faz menção não é para pedir permissão para se utilizar a ata, mas tão somente para saber quem é o fornecedor da mesma. Esta conclusão pode ser obtida pelo mero exame perfunctório do Parágrafo 1°, do art. 8°, do Decreto n.° 3931/2001, que dispõe da seguinte forma: “... Os órgãos e entidades que não participaram do registro de preços, quando desejarem fazer uso da Ata de Registro de Preços, deverão manifestar seu interesse junto ao órgão gerenciador da Ata, para que este indique os possíveis fornecedores e respectivos preços a serem praticados, obedecida a ordem de classificação. (...)” (grifo nosso).
[14] Processo n.° TC 008.840/2007-3 – REPR – Representação. REPRESENTAÇÃO DA 4ª SECEX VISANDO A ADOÇÃO DE MEDIDAS PELO TCU COM VISTAS A EVITAR POSSÍVEIS DANOS AO ERÁRIO ADVINDOS DA ADESÃO AO REGISTRO DE PREÇOS DO PREGÃO Nº 16/2005, SOB RESPONSABILIDADE DA COORDENAÇÃO-GERAL DE RECURSOS LOGÍSTICOS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE - CGRL/MS, EM CONSONÂNCIA COM O DISPOSTO NO ART. 237, INCISO VI DO REGIMENTO INTERNO/TCU. MIN-VC - ANTÔNIO VALMIR CAMPELO BEZERRA De: 02/04/2007 a 23/01/2008 e AROLDO CEDRAZ DE OLIVEIRA Desde: 23/01/2008

[15] JUSTEN FILHO, Marçal. In “TCU restringe a utilização de “Carona” no Sistema de Registro de Preços.” Artigo constante da revista O PREGOEIRO – Ed. Junho/2007.
[16] MUKAI, Toshio. In “Registro de Preços em Nível Federal Inconstitucionalidade do art. 8º (Figura do “Carona”) do Decreto n.º 3931/01 Possibilitação de Cometimento do Crime Previsto no art. 89 da Lei n.º 8666/93.
[17] FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. In SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS E PREGÃO. Belo Horizonte. 2003, Editora Fórum, 1ª edição – 2ª tiragem, p. 116.
[18] RONDÔNIA. Tribunal de Contas do Estado. Processo TC n.° 250/01. Relator: Conselheiro José Euler Potyguara Pereira de Mello, Boa Vista, 28 mar 2001.
[19] TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. AC 1100/2007 – Plenário. Ministro Ubiratan Aguiar. Data do Julgamento 06/06/2007.
[20] TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. AC 531/2007 – Plenário. Ministro Ubiratan Aguiar. Data do Julgamento 04/04/2007.
[21] JUSTEN FILHO, Marçal. COMENTÁRIOS A LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS, 10 edição, p. 119.
[22] JUSTEN FILHO, Marçal. In COMENTÁRIOS A LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS, 11 edição, p. 146.
[23] O que já mencionamos anteriormente, posto que não seria justo para o particular que está esperando fornecer alguns quilos de determinado produto, se ver, de uma hora para outra, obrigado a fornecer uma tonelada do mesmo produto. Além de provavelmente não o ter em estoque para pronto atendimento, o custo que terá com o transporte, embalagem do referido bem, provavelmente será superior ao percentual de lucro que teria com a venda, caracterizando assim, locupletamento por parte da Administração Pública.
[24] JUSTEN FILHO. Marçal. In COMENTÁRIOS A LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS. 11 edição. P. 154.
[25] TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. AC 1925/2006 – Plenário. Data da Sessão 18/10/2006. Relator: Ministro Augusto Nardes.
[26] Vide art. 3°, inciso III, da Lei n.° 10520/2002 e art. 9°, § 2°, do Decreto n.° 5450/05.
[27] TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. AC 531/2007 – Plenário. Data da Sessão 04/04/2007. Relator: Ministro Ubiratan Aguiar.
[28] In Comentários ao Decreto n.° 3931/2001. Texto retirado do site: http://www.zenite.com.br
[29][29] Parecer exarado pelo Procurador Federal Luiz Otávio Laxe Vilela em resposta a questionamento realizado pela Diretoria de Administração – DIRAD da Fundação Oswaldo Cruz. Pronunciamento n.° 518/2007 – CLC / PF.
[30] LEÃO, Eliana Goular. In “O Decreto Federal Sobre o Sistema de Registro de Preços”. Texto extraído do site HTTP://www.zenite.com.br. A autora é Advogada e Professora de Direito Administrativo da PUC – SP.
[i] A autora é Advogada e Consultora em Direito Administrativo.

sexta-feira, junho 01, 2007

A APLICAÇÃO DA LEI DE ARBITRAGEM NOS CONTRATOS PÚBLICOS



O presente estudo tem por objetivo discorrer acerca da Lei n.º 9307/96 e sua aplicação nos contratos realizados pela Administração Pública.

Após uma breve abordagem acerca da Arbitragem e do conceito de Contrato Administrativo, traremos à baila a discussão calorosa acerca do tema em questão e nossa opinião a respeito devidamente fundamentada.

Por fim, discorremos acerca do caso CEASA e a possibilidade de que a referida empresa de economia mista utilize o instituto da arbitragem em suas relações contratuais.



A Lei de Arbitragem

Em Maio do corrente ano a Lei n.º 9.307/96 completa 10 anos de vigência. Como se sabe, a arbitragem é um dos modos mais primitivos de solução de conflitos, remontando à época em que as autoridades públicas, quando e onde existentes, não se incumbiam de realizar justiça e garantir a pacificação social. Naquela época, arbitragem era o modo principal de solução de conflitos.

A partir do momento em que os Estados começaram a se responsabilizar pela administração e solução dos conflitos, instituindo a chamada justiça pública, a arbitragem permaneceu existente, mas como modo secundário na solução de disputas.

Em que pese existir há muito tempo, com o surgimento da justiça pública iniciou-se uma certa reticência na adoção da arbitragem como solução de demandas, como se o referido instituto retirasse do Estado parcela de poder, negando a face da jurisdição e muitas vezes, deixando de aplicar suas leis.

Ledo engano, nada mais impreciso.

A Lei de Arbitragem não deixa margem a qualquer dúvida, quanto a sua constitucionalidade.

Não obstante, quando presente a Administração Pública, surgem algumas dúvidas, porque os bens públicos são indisponíveis. Solucionar controvérsias contratuais por arbitragem quando a administração pública esteja envolvida é tema que suscita muitos debates.



Os Contratos Administrativos

O vocábulo “contrato” deriva do termo latino contractus , que significa convenção, pacto, acordo de vontades. Tradicionalmente, entende-se por contrato a relação jurídica formada por acordo de vontades, em que as partes obrigam-se reciprocamente a prestações concebidas como contrapostas, de modo que nenhum dos contratantes possa extinguir ou alterar unilateralmente o que nele está disposto.

O contrato administrativo marca-se, sobretudo, pela possibilidade da Administração instabilizar o vínculo seja alternando unilateralmente o que fora pactuado a respeito das obrigações do contratante, seja extinguindo unilateralmente o vínculo.

Historicamente, a doutrina francesa foi quem lhe deu os traços desenvolvendo a teoria do contrato administrativo, o qual originou-se em dois aspectos principais: quais os poderes ou sujeições inerentes ao “contrato administrativo”, ou seja qual seu regime; e, quando se deve reputar administrativo um contrato e, portanto, submisso a este regime.

Quanto ao tema, o ilustre Administrativista Celso Antônio Bandeira de Mello assim se manifesta:

“... não é difícil verificar que os traços peculiares ao regime do “contrato administrativo” giram em torno da supremacia de uma das partes, que, a seu turno, procede da prevalência do interesse público sobre os interesses particulares. Esta supremacia vai expressar-se tanto na possibilidade de instabilizar a relação (...) quanto na autoridade do contratante público. Esta autoridade se manifesta na presunção de legitimidade de seus atos, pelo amplo controle e fiscalização da execução do contrato, pela possibilidade de impor sanções ao contratante privado. Além disto, a supremacia do interesse público incompatibiliza-se, muitas vezes, com a possibilidade de o contratante privado invocar a exceptio non adimplenti contractus (exceção do contrato não cumprido). (...) com relação ao segundo aspecto – o de saber quando tal ou qual contrato é administrativo – firmou-se o entendimento de que teria este caráter o contrato firmado pela Administração que atendesse a um desses três requisitos: a) receber tal qualificação por lei; b) ter por objeto a própria execução de um serviço público; c) conter cláusulas exorbitantes.


O marco regulatório das contratações públicas brasileiras encontra-se unificado nas Leis n.º 8666/93 e 8.987/95. E o próprio texto legal que disciplina as contratações administrativas, distingue a atividade administrativa negocial em :

a) Contratos de direito privado da administração, que são os regidos pelo direito privado quando ao conteúdo e efeitos, e apenas quanto a eles;

b) Contratos administrativos regidos quando ao conteúdo e efeitos pelo direito público, embora supletivamente incidam os princípios da teoria geral dos contratos e as normas de direito privado.

Isto posto, verifica-se que existem duas modalidades de contratos celebrados pelo Estado: por um lado, aqueles de direito privado em que incidem as normas de direito público; de outro os de direito público que incidem as normas privatísticas.



A Lei de Arbitragem nos Contratos Administrativos

Ultrapassadas as considerações supra, passamos ao tema principal deste parecer, qual seja, a possibilidade de utilização da Lei n.º 9307/96 nas relações contratuais em que uma das partes seja a administração pública.

Instrumentos como a concessão de serviços públicos e privatização exerceram, na década de 90, importante papel na aceleração do processo de atendimento das necessidades de infra-estrutura, mediante a exploração pelo setor privado de recursos de propriedade do Estado e prestação de serviços públicos essenciais ao desenvolvimento do país.

Todavia, esse processo desencadeou uma mudança no modo de atuação do Estado, que atualmente, se aproxima do setor privado para, em conjunto, desenvolverem projetos essenciais ao desenvolvimento do país.

Como exemplo, podemos citar as PPP’s – Parcerias Público Privadas, as concessões outorgadas pelo Estado, empresas privatizadas que exerçam atividades econômicas ou se dediquem à prestação de serviços públicos, bem como os casos em que o Estado, diretamente ou por meio de sua Administração Indireta figure como contratante.

A Arbitragem nesses casos se revela, portanto, como o mecanismo adequado para a solução de controvérsias em relações contratuais da natureza das anteriormente mencionadas.

Em linhas gerais, as decisões que negam validade às cláusulas compromissórias nos contratos administrativos se fundam: a) na violação do princípio da legalidade, b) na violação do princípio da publicidade; e c) na violação do princípio da supremacia do interesse público sobre o particular.

O TCU em julgamento, conquanto tenha sentenciado ser inadmissível o juízo arbitral nos contratos administrativos, admitiu com muita ênfase, que falta apenas a autorização legal e cita um julgado antigo do TRF que dita textualmente não poder a autarquia celebrar compromisso para a resolução de pendências por meio de juízo arbitral sem autorização legislativa.

Do exposto, pode-se inferir que o entendimento do TCU não se volta para a hipótese de não ser admissível o instituto da arbitragem nos contratos administrativos, mas sim no sentido de que sua adoção deve necessariamente estar prevista em dispositivo legal.

Contudo, discordamos parcialmente do entendimento supracitado posto que entendemos já existir autorização legal para a utilização na arbitragem no contrato administrativo.

A Arbitragem, como meio de solução de controvérsias que envolvam direitos patrimoniais disponíveis, é passível de aplicação à Administração Pública Direta e Indireta em suas relações com os particulares podendo sua validade ser facilmente depreendida do disposto no art. 1º da Lei n.º 9307/96, cristalino ao determinar que a arbitragem aplica-se a “pessoas capazes de contratar”, o que, por óbvio, com recurso às disposições contidas no Código Civil, inclusive e além das pessoas físicas e jurídicas de direito privado, as pessoas jurídicas de direito público interno e, em especial, o Estado (União, Estados e Municípios), as autarquias, assim como as empresas estatais.

Ressalte-se que, inobstante a autorização legal genérica supramencionada, há leis especiais que também mencionam referida autorização, como é o caso das regras relativas a cláusulas essenciais de contratos de concessão nas áreas de energia elétricas, gás e petróleo, telecomunicações, transporte aquaviário e rodoviário que dispõem, mesmo com linguagem diferente, sobre a utilização da arbitragem na solução de controvérsias decorrentes dos contratos de concessão.

O Excelso Pretório, julgando o caso LAGE, reconheceu a legalidade do juízo arbitral, ainda que em ações contra a Fazenda Pública, assentando que legítima é a cláusula de irrecorribilidade, não ofendendo a Constituição Federal.

O STJ também admitiu o instituto da arbitragem para a sociedade de economia mista. A decisão pioneira e unânime é da 2º Turma. Os ministros reconheceram a validade da cláusula compromissória em contrato administrativo resultante de procedimento licitatório. O entendimento que conduziu o julgamento, proferido pelo Ministro João Otávio de Noronha, foi o de que o instituto da arbitragem é um meio eficaz e necessário para inserção dos agentes públicos e privados no mercado globalizado.

Podemos citar também acórdão da 7º Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, cujo entendimento firmou importante precedente jurisprudencial ao decidir ser possível e, até mesmo desejável, que uma sociedade de economia mista se submetesse a um procedimento arbitral, uma vez que assim acordou em compromisso arbitral livremente pactuado.

Outro ponto importante é definir quais as relações contratuais oriundas de contratos administrativos que podem ser submetidos a arbitrabilidade.

A Lei de Arbitragem limitou o escopo de sua aplicação a litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.

No direito arbitral o conceito de arbitrabilidade[1] subdivide-se em arbitrabilidade subjetiva e objetiva. A primeira refere-se aos aspectos da capacidade para poder se submeter à arbitragem e, como já vimos, no direito público e administrativo, seja como pessoa jurídica de direito público (entes federativos e autarquias) ou de direito privado (sociedade mista e empresa pública), o ente público e privado a possui. A segunda, que trataremos abaixo, refere-se ao objeto da matéria a ser submetida ao instituto em tela, ou seja, somente as questões referentes à direitos patrimoniais disponíveis.

Citando Diogo Figueiredo Moreira Neto[2], podemos dizer que o interesse público subdivide-se em interesse público primário e o secundário. O primeiro está relacionado com a sua relevância, considerando a segurança e o bem estar da sociedade, estes estão fora do mercado submetendo-se ao princípio da indisponibilidade absoluta. O último, interesse público secundário, tem natureza instrumental referindo-se às pessoas jurídicas que os administram e existem para que os primeiros sejam satisfeitos, sendo assim, podemos dizer que são interesses patrimoniais e, portanto, disponíveis.

Por conseguinte, forçoso dizer que o que não se pode confiar a árbitros são matérias ou atribuições que importem no exercício de um poder de autoridade ou de império dos quais não se pode transigir.

Segundo Selma Lemos[3], “... a Administração pode submeter-se à arbitrariedade e é conveniente que o faça quando não se trate de examinar nem decidir sobre a legitimidade de atos administrativos, mas de suas conseqüências patrimoniais” (grifo no original)

O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Eros Roberto Grau[4] ao analisar as particularidades do contrato administrativo firmado com particulares pondera que: “... embora a Administração disponha, no dinamismo do contrato administrativo de poderes que se tornam como expressão de “puissance publique”, (alteração unilateral da obrigação, v.g.) essa relação não deixa de ser contratual, os atos praticados pela Administração enquanto parte nessa mesma relação, sendo expressivos de meros “atos de gestão”. Em suma, é preciso não confundirmos o Estado–aparato com o Estado-ordenamento. Na relação contratual administrativa o estado-aparato (a Administração) atua vinculado pelas mesmas estipulações que vinculam o particular; ambos se submetem à lei (Estado-ordenamento); ou seja a Administração não exerce ato de autoridade no bojo da relação contratual.”

Nesse sentido podemos citar as ponderações efetuadas em precedente jurisprudencial que analisou a pertinência da inclusão de cláusula arbitral em contrato que dispunha sobre a adaptação e a ampliação da Estação de Tratamentos de Esgoto de Brasília, onde o Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal entendeu que “... para a sua consecução havia o fornecimento de diversos bens, prestações de obras civis, serviços de montagens eletromecâncias, etc. No caso, havendo dúvidas atinentes a tais disposições, podem perfeitamente ser solucionadas ante o juízo arbitral, tudo visando a eficiente consecução do objeto contratado[5]”.

Note-se que este precedente tornou-se o leading case para a matéria, e a Desembargadora Fátima Nancy Andrighi ao relatar o Mandado de Segurança em referência, brilhantemente, assinalou que: “... pelo art. 54 da Lei n.º 8666/93, os contratos administrativos regem-se pelas suas cláusulas e preceitos de direito público, aplicando-se-lhes supletivamente os princípios do direito privado o que vem reforçar a possibilidade de adoção do juízo arbitral para dirimir questões contratuais. Cabe à Administração Pública cumprir as normas e condições constantes do Edital de Concorrência, ao qual está vinculada”.

Outro importante nome na matéria, Pedro Batista Martins, aduz que “... seja na exploração empresarial de atividade econômica ou na prestação de um serviço público afeta a atos de gestão patrimonial, é legal e recomendável valer-se (e sujeitar-se) o Estado aos efeitos da cláusula compromissória.”[6]

Na mesma linha citamos o renomado autor, Adilson Abreu Dallari “... o interesse público não se confunde com o mero interesse da Administração ou da Fazenda Pública; o interesse público está na correta aplicação da lei e se confunde com a realização concreta da justiça; Inúmeras vezes, para defender o interesse público, para defender o interesse público, é preciso decidir contra a Administração Pública.”[7]

Portanto, NÃO HÁ VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

Outra questão levantada por aqueles que não se inclinam à utilização do instituto da arbitragem nos contratos administrativos seria a violação ao Princípio da Publicidade.

Tal argumento não merece prosperar.

No tocante ao Princípio da Publicidade a que estão submetidos todos os atos da Administração Pública entendemos que o mesmo não obsta a utilização do instituto, objeto do presente estudo.

Analisado o texto legal podemos depreender que o sigilo não constitui condição fundamental do procedimento arbitral, e sim uma faculdade das partes envolvidas, sendo possível dele prescindir para atender a interesse maior da sociedade, qual seja, o de sempre haja transparência nas relações da Administração Pública com os particulares.

Além disso, o sigilo seria obstado pelo controle externo ao qual sofrem as referidas obrigações contratuais administrativas. Não podemos esquecer que os instrumentos contratuais em referência estão sujeitos ao controle dos Tribunais de Contas e este órgão, segundo art. 71, da Constituição Federal procederá à fiscalização contábil, financeira e orçamentária dos mesmos, sendo os seus julgados documentos passíveis de exame por qualquer cidadão, portanto, não há o que se falar em violação ao princípio da publicidade.

A aplicação do princípio em comento será satisfeita na medida em que as partes sujeitas a tal obrigação reportem aos órgãos de controle o andamento do resultado da arbitragem.

Passamos agora ao Princípio da Supremacia do Interesse Público, outro obstáculo para a adoção do instituto da arbitrabilidade, segundo os contrários a sua utilização.

Não vislumbramos qualquer atentado ao referido princípio.

A arbitragem aproveitará apenas direitos patrimoniais disponíveis sendo tais direitos os mesmos para a Administração Pública e para um particular no curso de seus negócios, mantido assim, o interesse público.

As controvérsias relativas às cláusulas exorbitantes não darão lugar à arbitragem por se caracterizarem como direitos indisponíveis, estando assim excluídas do escopo da arbitragem.

E, nesse caso, o legislador previu no art. 25 da Lei de Arbitragem a obrigatoriedade de o árbitro, sobrevindo dúvidas quando à indisponibilidade dos direitos em discussão, suspender o procedimento arbitral e submeter ao Poder judiciário a apreciação da disponibilidade ou não dos direitos em questão para somente depois de proferida a disponibilidade de tais direitos, manifestar-se quanto ao caso em discussão.

Nesse sentido preleciona Caio Tácito “... A Convenção da arbitragem será em tais casos, caminho aberto a que, pelo acordo de vontades, se possa alcançar a plena eficácia da relação contratual. A discriminação entre as hipóteses, tendo como fundamento a natureza própria das obrigações contratuais, está a merecer tratamento no plano normativo que faculte, nos contratos administrativos, equivalência entre partes desiguais, de tal modo que as prerrogativas da Administração não onerem excessivamente a outra parte ou eliminem a fruição do direito do contratante privado. Se, indubitavelmente, em certos casos, o princípio da indisponibilidade do interesse público repele o compromisso arbitral, não há por que obstar o benefício da transação quando a natureza da obrigação de conteúdo mercantil, a ser cumprida pelo órgão público, possibilita que o acordo de vontade, fruto do vínculo bilateral, possa igualmente suceder o procedimento amigável como dirimente de eventual discrepância no entendimento da latitude da obrigação do administrador”.

Portanto, com as argumentações supra, caem por terra todos os argumentos contrários a adoção da arbitragem nas relações obrigacionais da Administração Pública.


A CEASA

A Centrais de Abastecimento do Estado do Rio de Janeiro S.A - CEASA/RJ, é uma sociedade por ações de economia mista, órgão da administração indireta do Estado do Rio de Janeiro, veiculada a Secretaria de Estado de Agricultura, Abastecimento, Pesca e Desenvolvimento do Interior.

Foi criada pelo Decreto Lei Estadual nº 228 de 20 de maio de 1970, pela Companhia Brasileira de Alimentos - COBAL, órgão do Ministério da Agricultura e Abastecimento.

Em 1988, foi estadualizada pelo Decreto Lei nº 2.400, de 21 de dezembro de 1988, mediante a assinatura do TERMO DE DOAÇÃO COM ENCARGOS, celebrado em 04 de novembro de 1988, entre o Governo do estado do Rio de Janeiro e a União, passando a composição do capital social ser o seguinte; GOVERNO DO ESTADO (99,9%) E OUTROS (0,1%).

A CEASA/RJ tem como objetivos básicos promover, desenvolver, regular, dinamizar e organizar a comercialização de produtos hortigranjeiros ao nível de atacado no Estado do Rio de Janeiro.

Para alcançar tais objetivos, coloca à disposição de seus usuários instalações adequadas ao comércio desses produtos, bem como serviços auxiliares à comercialização tais como informações de mercado, orientação comerciais, meios de comunicação, além de serviços indiretamente ligados à comercialização como serviços bancários, lanchonetes, serviços de vigilância, corpo de bombeiros, limpeza e outros.

Instalada na Avenida Brasil, nº 19.001 - Irajá - Rio de Janeiro, onde funciona a administração Central, a sua sede ocupa uma área de 2.146.253,00m2, dos quais 1.509.003 m2 encontram-se utilizados por edificações tais como prédio da administração, pavilhões de comercialização, pátios de estacionamento, ruas de circulação, portarias, galpão de caixotaria, balança, galpão de manutenção, galpão de beneficiamento, corpo de bombeiros, posto de segurança, jardins e gramados, postos de gasolina e estação de tratamento de esgoto.

A CENTRAIS DE ABASTECIMENTO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO S/A - CEASA/RJ, forma um sistema que atua tanto a nível de atacado (CEASAs), como a nível de produção (MERCADO DO PRODUTOR) e de varejo (VAREJÃO VOLANTE) e programas sociais (PROJETO PANELA CHEIA e COZINHA ESCOLA), permitindo dessa forma, acompanhar todas as fases de processo de produção e comercialização buscando a eficiência operacional do sistema como um todo.

O sistema compreende, atualmente, 05 (cinco) Unidades ligadas diretamente ao abastecimento de hortigranjeiros do estado, assim distribuídas: A Central Grande Rio em Irajá, 01 (uma) Unidade em São Gonçalo, e 03 (três) Mercados do Produtor; Região Serrana (Nova Friburgo), Paty do Alferes e Noroeste Fluminense (São José de Ubá), e na área de Varejo temos os Varejões Volantes. Além de convênios assinados para prestar assistências e cooperação técnica aos Mercados do Produtor de Água Quente (Teresópolis), Ponto de Pergunta (Itaocara) e em Varre-Sai. E os Centros de Abastecimentos, as Unidades de Campos e Macaé cedidos em convênio as Prefeituras.

As Unidades mencionadas constituem-se na verdade no grande elo de abastecimento do Estado, ligando a zona de produção ao consumidor passando pelas Centrais Grande Rio e Colubandê - São Gonçalo; com grande destaque para a primeira (CEASA-RIO), considerada a 2ª maior do Brasil em volume comercializado e virtualmente a responsável pelo abastecimento do 2º maior "estômago"do País, que é a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, já que atende a 90% do consumo desta população. Nesse contexto, verifica-se sua efetiva importância na economia do Estado, além de sua importância às atividades de produção e comercialização. Dessa forma, contribui enormemente para a formação de preços para o produtor na zona rural, contribui também como um vetor de indicação de produção, além de situar as condições de diversas culturas, volumes comercializados, procedência dos produtos e ocorrências nas zonas de produção. A CEASA possui um "Banco de Dados" capaz de subsidiar o governo em relevantes programas de produção e abastecimento de hortigranjeiros.

Por sua vez, a CEASA-RJ, muito contribui para o crescimento da produção de hortigranjeiros no estado. Não só por garantir ao produtor um espaço para comercialização de seus produtos, mas, sobretudo, por abrigar inúmeras condições que favorecem ao processo de comercialização, como: melhor formação de preços aos produtores em face de presença de grande número de compradores e vendedores; dinamização da compra e venda, dada a concorrência; e informações repassadas aos produtores através da conexão CENTRAIS-MERCADOS.

A adoção da arbitrabilidade pela CEASA é perfeitamente possível.

Revestindo-se como uma sociedade de economia mista, e, portanto, detentora de personalidade de direito privado nos termos da lei, as atividades desenvolvidas pela sociedade não constituem serviço público, portanto, prevalece o entendimento doutrinário favorável à manutenção do instituto ora analisado como modo de solução dos conflitos decorrentes dos contratos por ela celebrados.

O entendimento acima se baseia no fato de que as sociedades de economia mista no desempenho de atividades de cunho econômico e, portanto, essencialmente privadas, são e devem ser equiparadas aos particulares, devendo-lhes ser aplicáveis idênticas condições àquelas que se sujeitam às entidades privadas, também sob pena de violação do princípio da livre concorrência[8].

Tanto assim que no âmbito da atuação judicial, tais empresas não possuem qualquer prerrogativa ou diferenciação de tratamento face aos particulares confirmando o correto entendimento de que possuem iguais direitos e obrigações.

O tratamento igualitário entre particulares e empresas públicas na exploração de atividade meramente econômica conduz à possibilidade de utilização da arbitragem como modo de solução de conflitos, e mais do que isso é condição basilar de segurança jurídica inerente ao Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido citaremos novamente o acórdão da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, que firmou importante precedente jurisprudencial ao decidir ser possível, e, até mesmo desejável, que uma sociedade de economia mista se submetesse a um procedimento arbitral.

Não há, portanto, qualquer óbice dentro da sistemática do ordenamento jurídico brasileiro à submissão da Administração Pública e das empresas estatais à arbitragem, sendo que sua viabilidade depende tão somente da natureza da matéria em disputa ou seja, da arbitrabilidade objetiva.

Quando os contratos celebrados envolverem atividade econômica em sentido estrito, os direitos e obrigações deles decorrentes serão transacionáveis, disponíveis e, portanto, arbitráveis.

Somente em casos em que as atividades desenvolvidas decorram do poder de império estatal e cuja consecução esteja diretamente relacionada ao interesse público primário é que estão envolvidos direitos indisponíveis e, conseqüentemente, inarbitráveis.

A esse respeito, citaremos mais uma vez o Ministro Eros Roberto Grau: “... Não só o uso da arbitragem não é defeso aos agentes da Administração, como, antes, é recomendável, posto que privilegia o interesse público”.

Alijados a este pensamento, citamos os ensinamentos de Themístocles Cavalcanti: “Parece-me que a administração realiza muito melhor os seus fins e a sua tarefa, convocando as partes que com ela contratarem, a resolver as controvérsias de direito e de fato perante o juízo arbitral, do que denegando o direito das partes, remetendo-as ao juízo ordinário ou prolongando processo administrativo, com diligências intermináveis, sem um órgão diretamente responsável pela instrução do processo”.


CONCLUSÃO

De todo o exposto e principalmente diante de das decisões mencionadas reforçamos o entendimento no sentido de que não somente é possível que a arbitragem seja utilizada na solução de conflitos envolvendo empresas estatais de natureza patrimonial e disponível, como consagra-se como meio mais vantajoso e desejável à própria Administração na solução de tais conflitos.

Temos o entendimento de que a aplicação do instituto da arbitragem é totalmente factível encontrando o amparo legal necessário na legislação hoje vigente.

É o parecer.

[1] Conceito de João Bosco Lee, in “O conceito de Arbitrabilidade nos Países do Mercosul”.
[2] Diogo de Figueiredo Moreira Neto, “Arbitragem nos Contratos Administrativos”.
[3] Selma M. Ferreira LEMES et alii, in “Aspectos Fundamentais da Lei de Arbitragem”
[4] Eros Roberto Grau, “Da arbitrabilidade de litígios envolvendo sociedades de economia mista e da interpretação de cláusula compromissória”.
[5] Mandado de Segurança n.º 1998002003066-9, Conselho Especial do TJDF.
[6] Pedro Batista Martins, “O Poder Judiciário e a Arbitragem. Quatro anos da Lei n.º 9307/96”.
[7] Adilson Abreu Dallari “Arbitragem na Concessão de Serviço Público”.
[8] Art. 170, inciso IV, da Constituição Federal.